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Sobra inflação, falta direção

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Por Redação
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Sem esperança de fechar o ano com a inflação num nível civilizado, os especialistas manifestam algum otimismo, timidamente, apontando sinais de arrefecimento da alta dos preços mais importantes para as famílias. Nem isso está fácil, e os consumidores continuam com poucos motivos para se alegrar. Depois de ter subido 1,78% em janeiro, o IPC-S, um indicador atualizado semanalmente pela Fundação Getúlio Vargas, ganhou impulso no começo de fevereiro e bateu em 1,80%, taxa correspondente a um período mensal. O coordenador da pesquisa, Paulo Pichetti, ainda tentou um discurso animador: “Vários itens que pressionaram muito em janeiro devem começar a desacelerar a partir da próxima leitura”. A conta de luz é um bom exemplo: o ritmo de alta passou de 2,69% no mês passado para 1,71% no período até a primeira semana deste mês. Outros preços, como os de tomate, cebola, batata e cenoura, também devem evoluir mais favoravelmente, contribuindo para frear o aumento geral. Pesados os bons e os maus sinais, Pichetti reafirmou a expectativa de uma taxa próxima de 0,90% para o IPC-S no fim deste mês. Grande notícia?

À primeira vista, será um ganho importante para as famílias. De 1,78% para 0,90%, a taxa terá sido cortada quase pela metade no intervalo de um mês. Mas a inflação continuará muito longe de um ritmo suportável. Acumulada em 12 meses, uma taxa mensal de 0,90% resultaria numa inflação de 11,35%, pior que a de 2015.

No ano passado, os preços ao consumidor subiram 10,53%, de acordo com a pesquisa da Fundação Getúlio Vargas. No mesmo período, a inflação oficial, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), chegou a 10,67%. O IPCA é calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Os especialistas ainda apostam em aumentos de preços mais suaves que os de 2015, mas as projeções correntes apontam um resultado final muito acima dos padrões internacionais, tanto dos países desenvolvidos quanto dos emergentes e em desenvolvimento.

A pesquisa Focus, conduzida pelo Banco Central (BC), por meio de consultas a uma centena de instituições do mercado, tem apontado expectativas muito ruins desde o começo do ano. No levantamento mais amplo, a mediana das projeções coletadas na sexta-feira antes do carnaval indicou para o IPCA uma alta de 7,56% em 2016, bem acima do limite de tolerância (6,50%) e muito longe da meta oficial de 4,50%. Quatro semanas antes a previsão ainda era de 6,93%.

Também as projeções para o próximo ano têm ficado mais sombrias. Em quatro semanas, o número estimado para 2017 passou de 5,20% para 6%. Dirigentes do BC continuam prometendo levar a inflação à meta de 4,50% até o fim do próximo ano, mas o número de economistas dispostos a apostar nesse resultado tem diminuído a cada semana.

Mas a pesquisa Focus ainda tem previsões mais feias, embora menos visíveis. As projeções das chamadas Top 5, as cinco instituições com mais acertos no curto prazo, apontavam no dia 5 de fevereiro uma inflação de 8,15% neste ano. Como em anos anteriores, as taxas mensais devem recuar a partir de maio e voltar a crescer em setembro, ganhando impulso até dezembro.

As projeções, de toda forma, ainda são de uma alta de preços menor que a de 2015, mas a diferença tem diminuído seguidamente. Além disso, haverá pouquíssimo ou nenhum motivo para festejar, se a inflação de fato recuar de 10,67% para 8,15% ou mesmo 7,56% em mais um ano de forte contração da atividade. A recessão começou em 2014 e há pouca perspectiva de recuperação neste ano e em 2017.

O afrouxamento da política de juros pelo BC dificilmente se traduzirá em estímulo ao crescimento econômico, mas com certeza deixará mais espaço para os aumentos de preços. Como apostar em algum cenário melhor, quando o BC parece novamente seguir as ordens do Planalto e a chefia do governo se mostra incapaz de fixar um rumo claro para a política econômica?