A presidente Dilma Rousseff afirmou, em comício por ocasião do Primeiro de Maio, que o processo de impeachment é um “golpe” contra “as conquistas dos trabalhadores” e contra os programas sociais. Utilizando a mesma estratégia violenta que marcou sua campanha em 2014, que atribuiu a adversários planos malignos contra os pobres, Dilma disse que um eventual governo de Michel Temer vai “acabar com o Bolsa Família para 36 milhões de brasileiros”. Afirmou ainda que “eles” vão prejudicar principalmente “nossas crianças e nossos adolescentes”, que veriam sob risco “o acesso não só à alimentação, mas à saúde e à educação”.
Deveria ser motivo de vergonha para Dilma que o Brasil, governado pelo PT há mais de uma década, ainda tenha 36 milhões de pessoas tão dependentes do Bolsa Família. A vergonha seria ainda maior se fosse verdadeiro o discurso de Dilma segundo o qual as crianças que fazem parte desse contingente correm o risco até mesmo de passar fome – um evidente exagero típico da oratória petista.
A existência de tantos brasileiros que não conseguiriam alcançar um padrão mínimo de vida sem os recursos do Estado prova não somente o fracasso retumbante das ditas políticas sociais do PT, mas também demonstra que o País, embora com enorme potencial econômico, é ainda muito pobre e dependente de arranjos emergenciais para auxiliar uma parcela significativa de sua população.
A provável transição do governo petista para uma nova administração é oportunidade excepcional para que o País rediscuta o escopo dos programas sociais e dos gastos em áreas como saúde e educação, sem que isso seja motivo para que se acuse ninguém de prejudicar os mais pobres, como fez Dilma no palanque, ao dizer que “eles (sempre “eles”) falam em acabar com os subsídios do Minha Casa, Minha Vida”, em “acabar com uma parte do Bolsa Família” e também em liquidar “as conquistas na área de educação e de saúde”.
O lulopetismo, vocalizado por Dilma em seu exótico idioma, insiste em afirmar que seus adversários consideram os gastos sociais “como responsáveis pelo desequilíbrio do País”. É uma impostura: nenhuma voz representativa da oposição jamais fez essa relação.
Seria demais esperar de Dilma – especialmente agora, às vésperas de seu provável afastamento – uma atitude de respeito à oposição e à inteligência alheia. No entanto, ao apelar para mentiras e distorções, tal como fez ao longo de sua campanha pela reeleição, Dilma envenena a discussão sobre os programas e os gastos sociais.
Em primeiro lugar, está claro, conforme já notaram vários especialistas, que o atual desenho do Bolsa Família e de outras iniciativas na área social não prioriza as pessoas que mais precisam do benefício. “Já é evidente que o Brasil não tem tantos pobres assim quanto temos hoje no Bolsa Família. É claro que o Bolsa Família está inchado”, disse ao Estado Ricardo Paes de Barros, que participou da formulação do Bolsa Família e hoje assessora Temer. O programa foi ampliado para atender muito mais pessoas do que o necessário, demonstrando, de maneira cabal, seu viés eleitoreiro e populista.
É também eleitoreiro e populista defender a obrigatoriedade de grandes gastos em educação e saúde, como fez Dilma. O País precisa acabar com o engessamento de seu Orçamento, que eterniza o desequilíbrio das contas. Prometer gastos estatais cada vez maiores em setores com forte apelo eleitoral, sem definir a origem dos recursos a serem empenhados e demonizando aqueles que defendem a racionalização desses gastos, pode render muitos votos, mas é receita certa para o desastre.
Hoje está claro que não é por meio da manutenção indefinida de programas de transferência de renda nem da gastança pública irresponsável que a pobreza no Brasil será extirpada. Programas assim apenas perenizam a pobreza. O País só atingirá um novo patamar de desenvolvimento, com justiça social, se houver investimentos capazes de alavancar o crescimento sustentável e a geração de empregos – a única maneira racional de conferir independência e perspectivas de uma vida melhor à maioria dos brasileiros.