Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Vai ser duro vencer a ressaca

Exclusivo para assinantes
Por Redação
3 min de leitura

Já muito ruim, o cenário da economia brasileira ficou mais feio nas novas projeções divulgadas ontem pelo Banco Central (BC). A inflação estimada para o ano subiu de 7,9% para 9%, o dobro da meta oficial. A contração econômica prevista para 2015 passou de 0,5% para 1,1%. O País está vivendo uma ressaca, havia dito na véspera o ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Mas a ressaca passa e esse é o lado positivo, havia acrescentado. Podia ter dito algo mais: até lá, o Brasil ainda vai passar mal por um longo tempo e a recuperação será lenta e penosa. As novas estimativas estão no Relatório de Inflação, um panorama nacional e internacional publicado a cada três meses pelo BC. Os cálculos oficiais apontam alta de preços de 4,8% até o fim do próximo ano e de 4,5% nos 12 meses até o segundo trimestre de 2017, com o câmbio a R$ 3,10 por dólar e 13,75% de juros básicos, a taxa fixada na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). Mas o documento reafirma a promessa de levar a inflação à meta de 4,5% até o fim de 2015. Pode-se apostar, portanto, em novo aumento dos juros, se o BC realmente insistir nesse compromisso. Além disso, a autoridade monetária continua, segundo o relatório, confiando no sucesso da política fiscal anunciada para este ano. O ajuste das contas públicas, de acordo com o Ministério da Fazenda, deverá produzir em 2015 um superávit primário de R$ 66,3 bilhões para o pagamento de juros da dívida governamental. O êxito desse esforço será importante para o combate à inflação, de acordo com o BC. E se o governo reduzir a meta fiscal, como têm sugerido alguns analistas? É precipitação falar agora de uma nova meta, disse na terça-feira o ministro Levy. Mas a hipótese é razoável, porque os problemas de arrecadação e de controle dos gastos federais são notórios. Como agirão os dirigentes do BC, se o governo tiver de aceitar uma política orçamentária menos ambiciosa? Continuarão elevando os juros para levar a inflação aos 4,5% prometidos para o próximo ano? Economistas do setor privado já abriram a discussão e técnicos do governo têm falado sobre o assunto, pelo menos informalmente. Logo será preciso decidir se o combate à inflação e o aperto orçamentário produzirão, neste ano e no próximo, resultados suficientes para compensar a contração econômica e o desemprego. Os dados fiscais de maio, com divulgação prevista para os próximos dias, tornarão o cenário mais claro. Qualquer decisão – manter ou mudar as metas para a inflação e para as contas públicas – envolverá riscos. A Fazenda e o BC apenas começaram a reconquistar a confiança dos investidores, dos empresários e dos analistas. Quanto menor a confiança dos agentes, mais complicada será a tarefa das autoridades e mais penoso será o ajuste. O governo já enfrenta problemas consideráveis para mobilizar, no Congresso, a colaboração necessária a decisões muito importantes. Articulação política e comunicação competente serão tão importantes para o sucesso quanto a capacidade técnica. A travessia será de toda forma difícil e penosa, com as metas atuais ou com objetivos menos ambiciosos por algum tempo. Se os prazos do ajuste forem alongados, ainda assim as condições da economia continuarão precárias. A indústria derrapou nos últimos quatro anos, o desemprego já estava em alta no ano passado e o potencial de crescimento do País vem diminuindo há muito tempo. Será preciso muito mais que o ajuste das contas públicas e o combate à inflação para levar o País a um novo ciclo de crescimento. Só com investimentos muito maiores e ganhos significativos de produtividade a economia nacional ganhará novo impulso. O governo terá de se articular com o setor privado para cuidar desses pontos, com ou sem alteração das metas para o superávit primário e a inflação. Mesmo com metas mais baixas, será necessário um esforço considerável de correção dos grandes desajustes. Ao mesmo tempo será indispensável cuidar do revigoramento da economia. O plano de exportação recém-anunciado pode ser um começo – se o governo souber convertê-lo em algo mais que um conjunto de bons propósitos.