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Vetos à irresponsabilidade

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Por Redação
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Não poderia ter sido outra, senão o veto total, a decisão da presidente Dilma Rousseff sobre o projeto que reajustava os vencimentos dos servidores do Poder Judiciário com porcentuais que variavam de 56,4% a 78,6%. Ela tinha de fazê-lo, mesmo com o risco de ampliar a área de conflito com a parcela dos congressistas que, por interesses político-eleitorais, vêm aproveitando sua fraqueza política para criar obstáculos ao necessário ajuste das contas públicas e obrigá-la a tomar medidas que a tornam ainda mais impopular. Da mesma forma, Dilma agiu de maneira responsável ao vetar a emenda que concedia bilionária isenção tributária para o óleo diesel e que fora espertamente introduzida por parlamentares na medida provisória que reajusta a Tabela do Imposto de Renda Pessoa Física de forma escalonada.

Com o objetivo explícito de constranger ainda mais uma presidente acuada pela crise que parece não ter entendido e para a qual não tem respostas, parlamentares de diferentes partidos, entre eles o PT de Dilma, aceitaram votar e aprovar rapidamente medidas que os deixam bem diante do eleitorado, mas que geram despesas, bilionárias na maioria, para as quais não há receitas suficientes. Transferiram para a presidente o ônus de vetá-las, se ela assim julgasse necessário em nome de um mínimo de responsabilidade na gestão das finanças públicas.

A desarticulação da base governista no Congresso, a crescente insatisfação popular com o governo – alimentada pela crise econômica que a cada dia se torna mais grave –, a notória inapetência de Dilma para o entendimento com as diferentes forças políticas e a incompetência do Palácio do Planalto para dialogar com os demais Poderes criaram o ambiente propício para o florescimento de medidas irresponsáveis patrocinadas com dinheiro público, como as que acabam de ser vetadas.

A medida mais escandalosamente absurda aprovada pelo Congresso é o aumento dos servidores do Judiciário – que, mesmo sabendo da inevitabilidade do veto, fizeram protestos com buzinas, vuvuzelas e faixas em frente ao Palácio do Planalto na vã tentativa de evitá-lo. Não há justificação plausível para um aumento tão grande como o aprovado pelo Congresso. Num momento em que, por óbvias razões financeiras, todo o setor público está sendo forçado a cortar despesas – para alcançar uma meta fiscal que, mesmo modesta, parece distante – e os trabalhadores do setor privado são ameaçados pelo desemprego ou pela perda de renda real, aumentos salariais superiores a 50%, ainda que escalonados, soam como acinte.

A generosidade com o dinheiro público aprovada pelo Congresso tinha, ademais, uma grave deficiência formal, como lembrou a presidente ao justificar o veto. A medida desrespeita a determinação constitucional de que qualquer vantagem ou aumento de remuneração no setor público só pode ser concedido se houver prévia e suficiente dotação orçamentária e se o aumento de gasto estiver previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Cálculos do governo indicam que o aumento aprovado pelo Congresso geraria um custo adicional de R$ 25 bilhões nos próximos quatro anos e, a partir daí, despesas fixas adicionais de R$ 10 bilhões por ano.

Quanto à isenção do PIS e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) para o óleo diesel, o veto, como explicou a presidente em mensagem ao Congresso, se deveu ao fato de que, além de implicar renúncia de receita – estimada em R$ 13,8 bilhões por ano –, a medida viola a Lei de Responsabilidade Fiscal ao não estimar seu impacto financeiro nem apresentar as devidas compensações financeiras.

Os dois casos deixam claro como, agindo com esperteza e oportunismo, membros do Congresso sabem aproveitar-se da fragilidade do governo e da desarticulação de sua base parlamentar para aprovar qualquer coisa que lhes interesse, mesmo que notoriamente carente de base legal.