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O método

A Jair Bolsonaro e a quem o cerca intimamente pode não interessar ser 'eficiente' a sua relação com o Congresso

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Por Notas & Informações
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Durante evento promovido pelo Estado e pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV) sobre as perspectivas econômicas para o País, o cientista político Fernando Limongi afirmou que o governo federal é “ineficiente” na relação com o Congresso Nacional. No painel Presidencialismo à Bolsonaro, o professor da Escola de Economia da FGV apontou que, das 11 primeiras Medidas Provisórias (MPs) editadas pelo governo Bolsonaro, 7 perderam a eficácia por não terem sido votadas em tempo hábil. “O governo tem um certo desinteresse pelas próprias propostas que envia ao Legislativo”, disse Limongi.

Está-se diante de algo mais maléfico para a democracia do que o aparente desinteresse do governo pela defesa de sua própria agenda e a ineficiência na relação com os parlamentares, fatos que por si sós já seriam graves. Entre Executivo e Legislativo praticamente não há articulação política. Igualmente, a esta altura também está claro que o presidente Jair Bolsonaro não tem um projeto para o País, o que sugere que ele mesmo tenha sido pego de surpresa por sua vitória no pleito do ano passado.  Esses dois fatores, de fato, aumentam os problemas da condução da pauta legislativa do governo federal. Mas o que há de preocupar os brasileiros devotos da democracia é outra coisa.

Há um método na forma como o presidente Bolsonaro tem pautado a sua relação com a chamada “classe política”, e isso vem desde a campanha eleitoral, quando se apresentou aos eleitores como alguém “novo”, alheio a ela, não obstante ter passado quase três décadas no Legislativo como um obscuro deputado do baixo clero. É da essência do bolsonarismo - e este é um dos fatores preponderantes para a vitória do capitão reformado - manter viva a contraposição entre o “povo” e “os políticos”, noções muito particulares que habitam a mente do presidente e de seus mais próximos interlocutores.

O que pode estar por trás do “desinteresse” do presidente Jair Bolsonaro em defender com habilidade e afinco seus projetos no Legislativo e, mais do que isso, a sadia relação entre os Poderes, é uma tentativa de enfraquecer a democracia representativa.

A prática não é inédita no mundo de hoje e já constitui mesmo um modo de governar. O presidente já enviou projetos de lei, MPs e decretos ao Congresso bastante controvertidos, para dizer o mínimo, quando não frontalmente inconstitucionais ou tecnicamente sofríveis. Em geral, versam sobre temas bastante caros ao nicho mais extremado de seus apoiadores, uma parcela da população que vem diminuindo, como mostram recentes pesquisas de opinião, mas que é bastante barulhenta nas redes sociais.

Uma vez rejeitados os projetos de iniciativa do governo federal por deputados e senadores, seja por razões de ordem técnico-jurídica, seja por tratarem de questões que não estão pacificadas no seio da sociedade representada pelo Congresso, o presidente Jair Bolsonaro passa a ter um rol de responsáveis a quem atribuir o “ônus” de não conseguir “transformar o País” como desejam aqueles que o elegeram. Não surpreende, pois, que um de seus filhos tenha criticado recentemente o vagar das discussões democráticas. De fato, só em regimes autoritários as coisas andam na velocidade do desejo do senhor.

A articulação política do governo federal, quando se apresenta, tem sido pautada pelo encaminhamento dos assuntos familiares do presidente Jair Bolsonaro, como a indicação de um de seus filhos para a embaixada brasileira nos Estados Unidos e os avanços sobre a autonomia de órgãos como o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e a Polícia Federal com vistas, como se noticia, a proteger outro filho de investigações. “A nova política é só para os outros”, disse Fernando Limongi no evento Estadão/FGV-Ibre.

Deve-se ter em mente que ao presidente Jair Bolsonaro e a quem o cerca intimamente pode não interessar ser “eficiente” a sua relação com o Congresso Nacional.