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Os horizontes da agropecuária

Na próxima década, algum progresso deve ser realizado em relação aos objetivos da ONU

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Por Notas & Informações
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A agricultura global tem o desafio de, a um tempo, garantir a segurança alimentar e dietas saudáveis para uma população em crescimento e reduzir as agressões ao meio ambiente. Na próxima década – segundo as projeções do Panorama Agrícola 2021-30 da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) –, algum progresso deve ser realizado em relação aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável 2030 da ONU. Mas a pandemia afastou o sistema agrícola das metas e, sem esforços adicionais, as emissões de gases de efeito estufa por parte da agricultura aumentarão e o objetivo de Fome Zero não será atingido.

A demanda deve ser reconfigurada por tendências demográficas, a substituição de carne vermelha por aves nos países ricos e uma explosão do consumo no sul da Ásia.

Os desafios de erradicar a fome variam conforme os países. O Panorama projeta para a década um crescimento de 4% na disponibilidade de alimentos. Mas as dietas nos países de baixa renda – especialmente na África – devem permanecer em grande parte inalteradas.

A intensidade do carbono na produção agrícola deve declinar. Ainda assim, as emissões de gases de efeito estufa devem crescer 4%. Esforços adicionais de produção sustentável, especialmente na pecuária, serão indispensáveis.

Em 2020, a demanda da China e as constrições ao crescimento da produção levaram à alta das commodities. Mas ao longo dos anos as melhorias na produtividade e a desaceleração da demanda devem levar a um declínio nos preços. “Na próxima década, variações climáticas, pestes e doenças animais e vegetais, mudanças nos preços dos insumos, desenvolvimentos macroeconômicos e outras incertezas resultarão em variações sobre os preços projetados.”

Isso pode implicar uma pressão sobre a renda de pequenos proprietários, incapazes de reduzir seus custos por meio do aumento da produtividade. O Panorama enfatiza o papel crítico dos investimentos públicos e privados em políticas que garantam o amplo acesso a insumos; tecnologias que aumentem a produtividade; infraestrutura; e treinamento agrícola.

O Panorama confirma as tendências de crescimento para o Brasil. A demanda por alimentos deve crescer na próxima década em linha com a produção pecuária, na taxa anual de 1,3%. Junto com China e EUA, o País responderá por mais da metade do crescimento da produção de milho, sendo o segundo maior exportador. Até 2030, o Brasil deve se tornar o maior produtor de soja, respondendo por 50% das exportações globais. Boa parte desses avanços será promovida por melhorias no sistema de plantação rotativa entre o milho e a soja.

O Brasil deve manter sua posição como o maior produtor de cana-de-açúcar, sobretudo porque o consumo de etanol continuará a crescer. Mas a evolução dos setores globais de energia e transporte pode ser um fator de incerteza que precisa ser monitorado. O foco crescente em sustentabilidade das reformas em andamento (por exemplo, na União Europeia), assim como novas políticas de biocombustível, também impactarão a demanda por cereais.

A produção nacional de algodão é destacada como um exemplo de boas práticas. A produtividade aumentou por causa da rotação com grãos como soja e milho e a adoção de novas tecnologias. Cerca de 80% da produção é certificada por selos de sustentabilidade, levando o Brasil à liderança na produção sustentável de algodão.

Exemplos como esse são importantes porque, de um modo geral, o Panorama registra que, junto às incertezas fiscais – que podem gerar depreciação da moeda e distúrbios no equilíbrio comercial –, a maior ameaça ao crescimento da agricultura brasileira são as apreensões ambientais. Políticas públicas e iniciativas privadas para fomentar a agricultura intensiva, o uso de terras já desflorestadas e a rastreabilidade dos fornecedores serão cruciais para garantir tração à exportação brasileira. Isso também será crucial para que o País possa fechar acordos em andamento – como o Mercosul-União Europeia – e ampliar o acesso a novos mercados.