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Opinião|A defesa nacional para discussão da sociedade

Não é possível ser pacífico sem ser forte, como alerta o barão do Rio Branco

Atualização:

“A disciplina militar prestante/ Não se aprende, Senhor, na fantasia,/ Sonhando, imaginando ou estudando,/ Senão vendo, tratando e pelejando” - Luís Vaz de Camões O Executivo, cumprindo o disposto na lei complementar que trata da organização, do preparo e do emprego das Forças Armadas (FFAA), enviou ao Congresso Nacional a Política (PND) e a Estratégia (END) Nacionais de Defesa, documentos básicos para o planejamento e execução de todas as atividades voltadas para a defesa do País, desde o recrutamento até os acordos internacionais, e também o Livro Branco da Defesa Nacional (LBDN), este um inventário sobre os meios bélicos disponíveis. O ato foi reforçado por elegante gesto do próprio ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, ao levar ao presidente do Congresso, em companhia dos três comandantes das Forças, exemplares daqueles documentos.

Renova-se a esperança de que desta vez, finalmente, nossos senadores e deputados dediquem algum tempo a esse tema tão importante para a preservação de nossa soberania e nossos interesses. Omitir-se no papel que outorgaram a si mesmos não os eximirá da responsabilidade pela insuficiência ou ineficácia dos meios de defesa, além de privar as FFAA da necessária interlocução com os representantes mais legítimos dos interesses dos brasileiros para as decisões que afetam a segurança da Nação.

As versões recém-propostas trazem importantes avanços conceituais e formais, que garantem significativa evolução em relação às antecessoras. Podemos dizer com orgulho que o Brasil tem PND e END coerentes com a estatura de uma das dez maiores economias do mundo, baseada na nossa realidade e que preserva a autonomia tão importante para decisões de Estado.

O conteúdo de ambos os documentos deve responder a uma pergunta simples, ainda que de desdobramentos complexos: a política e a estratégia em conjunto permitem criar as condições materiais, doutrinárias e anímicas necessárias para vencer?

Vencer é o elemento central da atividade militar e, por isso mesmo, a grande servidão dos generais. A guerra, entendida como a preservação da soberania, não admite alternativa à vitória, simplesmente porque não há reparo possível para a soberania maculada. A História é farta em registros do trágico destino dos vencidos.

A melhor vitória, como ensina Sun Tzu, é a que se obtém sem combater, pela dissuasão, estratégia acertadamente priorizada pela END, que visa a desencorajar agressões demonstrando que a reação cobrará um preço demasiado alto para ser tentada, desde que não se descuide, claro, do alerta do barão do Rio Branco de que não é possível ser pacífico sem ser forte, o que também tem custos.

É nessa direção que se orienta, por exemplo, o sistema de educação de defesa. Ele precisa formar líderes vencedores, capazes de influenciar seus subordinados pela força de seu exemplo, pela retidão de seu caráter e pela confiança na sua cultura profissional.

A educação militar trata, em última análise, da gestão do uso legal, racional, suficiente e eficaz da força em defesa do Estado. Ela não admite, pois, preferências partidárias e ideológicas, nem simpatias e humores políticos. Se vencer é o dever intransferível do general, educar seus quadros também o é, porque a ele caberá responder pelo resultado. 

Formar um líder militar exige abordagem integral do discente, fazê-lo incorporar valores, absorver vasta gama de conhecimentos e adquirir capacidade física e higidez suficientes para superar as naturais dificuldades e severas privações do combate. É uma metodologia de ensino voltada para as áreas cognitiva, afetiva e psicomotora simultaneamente, por processos que integram diversos campos do conhecimento para a solução de problemas obrigatoriamente inéditos.

Lutar a guerra passada é receita para o fracasso, diz um conhecido adágio militar, por essa razão o estudo dos conflitos não é a busca do visível nas manobras de cada lado, mas compreender a forma como foram priorizados os fundamentos doutrinários dos diversos tipos de operações, com que intensidade foi valorizado cada um dos chamados princípios da guerra e como foram empregados os recursos tecnológicos para produzir favoravelmente o desequilíbrio desejado. A comparação dos meios materiais de forças em confronto oferece o que se chama de poder relativo de combate, que pode ser potencializado por fatores intangíveis, como tradição, experiência de combate, personalidade do comandante, vontade nacional e sistema de educação militar, entre outros.

A arte da guerra se aprende no estudo dos clássicos, de Sun Tzu a Liddel Hart, dos grandes capitães, de Alexandre, o Grande, a Napoleão, e dos grandes líderes militares nacionais, de Caxias e Osório a Plínio Pitaluga e Castelo Branco.

Discutir FFAA sem ter em conta sua real destinação e suas peculiaridades é esforço estéril, que, com frequência indesejável, escorrega para delírios ideológicos improdutivos, insinuação de censura a determinados autores e comparações incompatíveis com a grandeza do Brasil.

GENERAL DA RESERVA, FOI MINISTRO DO GABINETE DE SEGURANÇA INSTITUCIONAL

Opinião por Sergio W. Etchegoyen