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Opinião|Crescimento econômico de baixo carbono

O Brasil pode liderar o mundo na transição para um caminho de baixas emissões

Atualização:

A questão que mais se destacou em 2018 para as perspectivas de crescimento econômico dos países foi o impacto devastador da negligência ambiental e da mudança climática induzida pelo homem. Para o Brasil a escolha se coloca entre buscar um crescimento econômico anual no curto prazo de 3% a 4% em detrimento do meio ambiente, ou se empenhar no crescimento sustentado de longo prazo por meio de ações ambientais e climáticas. Esta última opção é muito melhor para o País, mas é preciso ter vontade política para ser posta em prática.

Quando há uma estagnação no crescimento econômico, é tentador pôr a culpa nas regulamentações ambientais e nas ações climáticas. Porém está claro que crescer à custa da destruição do meio ambiente não produziu o avanço econômico sustentado no Brasil. Uma estratégia de crescimento de longo prazo precisa de investimentos e cuidado, não apenas em relação ao capital físico e humano, mas também ao capital natural, especialmente num país como o Brasil, com a riqueza de seus recursos naturais.

Além disso, as recentes inundações, tempestades, secas e ondas de calor que bateram recordes alertam que o aumento das emissões de carbono vai acelerar a mudança climática, prejudicando vidas e meios de subsistência e reduzindo o crescimento econômico. Com a sua extensa costa e diversos tipos de solo, o Brasil é altamente vulnerável a enchentes e secas.

Os perigos estão aqui e agora. Os cientistas vêm alertando que a maior probabilidade da ocorrência desses eventos extremos está associada às emissões de carbono e mudanças no clima. Em 2018 houve chuvas intensas na cidade de São Paulo e a precipitação em apenas uma hora no Rio de Janeiro correspondeu à de um mês inteiro. O Sudeste foi atingido recentemente por uma prolongada seca, exacerbada pelo desmatamento e as mudanças climáticas. Enquanto isso, a Argentina e o Uruguai sofreram secas recordes. Nos Estados Unidos houve grandes destruições provocadas por enchentes monumentais e pelos piores incêndios florestais da história do país.

O Brasil é o 11.º maior emissor de dióxido de carbono, mas tem sido também um dos líderes na mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. Como maior mercado de energia renovável da América Latina, o País pode se tornar altamente competitivo em energia eólica, solar e hídrica. Energia renovável pode ser o maior nicho das contribuições do Brasil e um motor de crescimento econômico.

Contudo, após os avanços registrados desde 2005, houve um recente e acentuado aumento do desmatamento e das emissões de carbono – o que vai em sentido contrário ao compromisso assumido pelo Brasil no Acordo de Paris de reduzir a zero o desmatamento ilegal na Amazônia brasileira em 2030. Em agosto de 2018 o País derrubou três vezes mais árvores do que a área devastada no mesmo período do ano anterior.

A importância do Acordo de Paris é que todos os países, ao imporem limites às emissões de carbono, criaram um instrumento valioso, como o estabelecimento do preço de uma matéria-prima, para modificar e compartilhar o uso do ar, que, por ser livre, acaba sendo mal utilizado. A adoção dessa medida por todos os interessados acarretará grandes benefícios para a economia brasileira.

Com milhões de hectares de terras abandonadas ou subutilizadas, o Brasil pode usar os solos degradados para expandir a fronteira agrícola, sem precisar se aventurar em novas áreas. Afinal, o desmatamento ilegal é, em sua maior parte, a apropriação privada de recursos públicos, com impacto econômico negativo. O crescimento de baixo carbono na agropecuária também se estende ao transporte, no qual é possível depender menos de novas estradas e mais de ferrovias e hidrovias.

Outros países também necessitam realizar profundas mudanças. As emissões da China continuam a aumentar, embora o país esteja investindo em energia renovável. A atual administração dos Estados Unidos vem desmontando as políticas de proteção do meio ambiente, substituindo-as por ações favoráveis aos combustíveis fósseis, que poderão provocar um grande aumento das emissões de carbono – o que prejudica a vida dos americanos e constitui um crime contra o desenvolvimento global.

Enquanto isso, algumas soluções políticas e tecnológicas estão sendo adotadas em âmbito local. O número de cidades no mundo que utilizam energia limpa duplicou nos últimos três anos. Uma lei de 2018 aprovada na Califórnia exige que toda a eletricidade seja proveniente de fontes renováveis ou sem emissões de carbono até 2045, com metas intermediárias para 2026 e 2030. Chile, Alemanha, México, África do Sul e Reino Unido estão começando a cobrar impostos sobre o carbono.

Relatórios das Nações Unidas e do governo dos Estados Unidos, divulgados no ano passado, sugerem que se está reduzindo rapidamente a expectativa do alcance de um nível máximo das emissões globais em 2020, passando, na sequência, a uma queda acentuada, para manter o aumento da temperatura abaixo de dois graus centígrados. Se os países principais emissores, incluindo o Brasil, seguirem a rota de aumento para as emissões de carbono, o aquecimento atingirá de fato mais de dois e até três graus Celsius, impedindo assim todas as perspectivas de crescimento econômico.

A pergunta crucial não é se o Brasil vai retomar o crescimento, mas como esse crescimento se pode concretizar incorporando as ações sobre o clima. O País é altamente vulnerável às mudanças climáticas e tem todo o incentivo para liderar o mundo na transição para um caminho de baixas emissões de carbono.

*PH.D EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE DE CHICAGO, AUTOR DE ‘CLIMATE CHANGE AND NATURAL DISASTERS’ (2018), FOI DIRETOR DO BANCO MUNDIAL PARA O BRASIL 

E-MAIL: VNDTHOMAS91@GMAIL.COM

Opinião por Vinod Thomas