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Pesquisador em Educação e doutor em Economia pela Universidade Vanderbilt (EUA), Claudio de Moura e Castro escreve mensalmente na seção Espaço Aberto

Opinião|Florestas nativas ou florestas ‘inventadas’?

Podemos pensar num cenário em que os recursos da iniciativa privada poderão ser atraídos com sucesso, como aconteceu no agronegócio brasileiro.

Atualização:

Maltratamos as nossas florestas. Foram-se as matas de enormes nacos do nosso território. Antes, eram poucos brasileiros e os machados penosos no uso. Mas nas últimas décadas, na orgia das motosserras, cortamos mais do que nos 500 anos anteriores. A perda foi gigantesca.

Uma invenção made in Brazil! Criamos uma agricultura tropical sustentável e altamente produtiva. Podemos alimentar 1 bilhão de pessoas a mais, sem cortar uma só árvore. Por que desmatar, então?

Não se trata de, nostalgicamente, lamentar a beleza das florestas destruídas. As consequências das perdas florestais e da diversidade são graves. Nossos rios minguaram dramaticamente, a falta d’água generalizada está logo ali, na esquina. A temperatura está aumentando e os prognósticos de um desastre climático deixaram de ser recreações de cientistas imaginativos. De fato, são para valer.

Portanto, é preciso parar de cortar, cuidar bem das florestas que restaram e repor as que foram perdidas. Aqui, lido apenas com o reflorestamento.

Quem poderia fazê-lo? Nosso Estado gasta o que devia e o que não devia, além de estar confuso nestes assuntos de meio ambiente. Muito se deve cobrar, mas não vemos resposta comensurável com o tamanho do problema.

A sociedade civil deve ser vista como um poderoso catalisador, como uma promotora, como uma voz de advocacy. Mas, mesmo nos cenários mais otimistas, pouco pode plantar com seus modestos fundos.

Portanto, se algo grande vai acontecer, terá de ser com os recursos, iniciativas e dinamismo do setor privado. A pujança do nosso agronegócio está assentada na ciência e no novo capitalismo agrário brasileiro. É nesse modelo que poderão surgir os investimentos em florestas, comensuráveis com a gravidade das ameaças.

Mas é mister entender a lógica dos negócios. Se o empresário não condicionar seus investimentos às expectativas de um retorno econômico, vai à falência. Essa é a inefável natureza dos mercados. Sendo assim, é preciso que plantar florestas seja um bom investimento.

Florestas que reproduzem a cobertura nativa – sem créditos de carbono – são um péssimo negócio. Há belas exceções, mas, diante do problema, são iniciativas diminutas.

Até recentemente, a única solução economicamente rentável eram as florestas homogêneas. Remexendo geneticamente uma árvore da Austrália, criamos eucaliptais de excepcional produtividade. São uma obra-prima da tecnologia. Crescem seis vezes mais rápido do que as florestas da Escandinávia. Absorvem CO2 copiosamente, mitigando o aquecimento global. A partir de seis anos, podem ser cortados. 

Mas florestas homogêneas não são o ideal do ponto de vista ecológico. Nenhum sentido faz substituir por elas as florestas nativas. Porém, diante de campos pelados – cujas dimensões são equivalentes aos Estados de Minas Gerais, Bahia e São Paulo –, são amplamente mais benéficas para o meio ambiente, como demonstram muitas pesquisas. Ainda assim, eucaliptos são apenas soluções parciais.

Entra em cena uma coleção de florestas que nunca existiram na natureza, são florestas “inventadas”. Exploram-se muitas fórmulas que, do ponto de vista do meio ambiente, são bem-vindas. Ademais, revelam-se excelentes investimentos. Com elas, poderemos ter uma revolução equivalente à do agronegócio.

Uma solução promissora são florestas homogêneas, mas com espécies nativas. O paricá (da Amazônia) cresce furiosamente, meio metro por mês, nos primeiros dois anos. Com seis, já pode ser cortado e encontra amplo uso comercial (compensado, polpa, etc.). Já foram plantados 60 milhões em Paragominas, pelos proprietários locais. Sendo nativa, dá guarida e alimenta os animais da floresta.

Uma segunda solução é plantar apenas árvores de valor comercial, tais como imbuia, vinhático e outras. É diferente das matas nativas, contendo centenas de espécies sem valor comercial. Plantam-se apenas 10 ou 15. Ademais, estão sendo geneticamente trabalhadas para serem mais retas e crescerem mais rápido.

A terceira solução, o plantio consorciado, é um mistureba de espécies. Cito apenas um caso. Enterra-se uma muda de jacarandá e, ao lado, abacaxi e banana. Junto vão as mudas de café e cacau. E, em alguns casos, entra gado também na área. Esperar 40 anos para cortar o jacarandá é um suicídio econômico. Mas o abacaxi é colhido no primeiro ano, a bananeira traz sombra para o cacaueiro, que começa a produzir em poucos anos, e o café, em menos tempo ainda. Sendo assim, o investimento é viável e lucrativo, pois produz receitas durante todo o ciclo.

Uma pesquisa cuidadosa (Reflorestamento com Espécies Nativas: Estudo de Casos, Viabilidade Econômica e Benefícios Ambientais) examinou 40 casos, encontrando um bom retorno econômico – em diferentes biomas, até no Semiárido. Embora ainda sejam experimentos de alcance limitado, as promessas são enormes. Sem subtrair da responsabilidade do Estado e o papel crítico da sociedade civil, podemos pensar num cenário em que os volumosos recursos da iniciativa privada poderão ser atraídos com sucesso, como aconteceu no agronegócio brasileiro. Aleluia!

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M.A., PH.D., É PESQUISADOR EM EDUCAÇÃO

Opinião por Claudio de Moura Castro
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