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Opinião|O papa aos jovens: Cristo vive!

Jesus é a inspiração para o constante rejuvenescimento da Igreja e do mundo

Atualização:

Em outubro de 2018 o papa Francisco presidiu a quinta assembleia ordinária do Sínodo dos Bispos, com o tema Juventude, Fé e Discernimento Vocacional. O tema é de grande interesse para a missão da Igreja Católica, pois as novas gerações são destinatárias privilegiadas da mensagem do Evangelho. É preciso reconhecer desde logo que os jovens atualmente não são muito alcançados pela missão da Igreja. Portanto, convinha uma séria reflexão da Igreja sobre o tema e essa reflexão contou com a participação de um grupo representativo de jovens de vários países, incluindo o Brasil.

No dia 25 de março passado o papa Francisco assinou a sua exortação pós-sinodal sobre o “sínodo da juventude”, como passou a ser chamado. Ele quis fazer esse gesto no santuário e Loreto, na Itália, onde, segundo uma tradição que vem da época dos cruzados, estaria abrigada a “casinha de Nazaré”, que serviu como lar para Jesus na infância e na juventude. Os jovens são parte da família humana e a Igreja deve ser um lar para eles.

No último dia 2 de abril, aniversário do falecimento do papa São João Paulo II, o “papa da juventude”, a exortação apostólica foi publicada com o nome Christus vivit (Cristo vive). Francisco dirige-se aos jovens em tom coloquial, como quem escutou suas reclamações e críticas contra a Igreja, e os convida a acompanharem sua reflexão. Nos nove capítulos do documento, dirigido primeiramente aos próprios jovens, mas também a toda a Igreja, o papa Francisco reflete sobre o que a palavra de Deus diz sobre os jovens, abordando passagens bíblicas que falam do amor privilegiado de Deus por eles.

Em seguida, o texto mostra a relação de Jesus Cristo com os jovens e destaca o quanto também a Igreja precisa voltar-se para eles. Jesus Cristo é inspiração para o constante rejuvenescimento e renovação da Igreja e do mundo. Sua mensagem, suas atitudes e seus exemplos oferecem esperança e fé no futuro e a constante renovação das energias do bem.

Francisco detém-se nos desafios, angústias e buscas dos jovens do nosso tempo e os encoraja a terem confiança nos altos ideais que trazem no coração e nem sempre veem presentes na vida e na cultura da sociedade e da própria Igreja. Os problemas do presente não devem levar à resignação e ao desânimo, mas a uma busca constante e criativa.

Existe uma saída, escreve o papa, exortando os jovens a olharem mais para os bons exemplos e as práticas boas, orientando-se por elas. E nesse sentido o papa faz um grande anúncio a todos os jovens: tenham a certeza do amor de Deus, que por Jesus Cristo lhes manifestou esse amor de forma extrema. Deus deseja que nenhum jovem se perca e que todos tenham vida plena. A descrença na vida leva muitos jovens ao desânimo, ou a depositar o valor da vida apenas em pequenas e fugazes satisfações. A fé em Deus leva a descobrir o valor alto da vida e a aderir ao “projeto de vida” do Criador para a humanidade, um projeto de amor pelo qual vale a pena viver e gastar as melhores energias.

O documento propõe uma reflexão sobre aspectos antropológicos fundamentais da juventude, identificada como a idade dos sonhos e das escolhas, da vontade de fazer experiências marcantes no caminho da maturação progressiva, mediante processos educativos e de comprometimento. Francisco convida os jovens a percorrerem com dedicação e paciência as fases próprias da vida, a não se deixarem levar pela cultura do provisório e do descarte, nem do acúmulo de riquezas e consumo de bens materiais. A vida vale mais que os bens, pois ela mesma é o maior bem confiado a nós.

Em relação à sexualidade, Francisco adverte contra o que ele chama de “colonização ideológica” da sexualidade e do casamento. Num mundo que valoriza excessivamente, e até de forma equivocada, a sexualidade é difícil manter uma relação saudável com o próprio corpo e viver serenamente as relações afetivas. O papa convida os jovens a superar tabus e conceitos distorcidos em relação ao sexo e à sexualidade, que devem ser vistos como dom de Deus em vista do amor e da geração da vida.

E os exorta a cultivar as próprias raízes, sem se perderem em propostas abstratas e ideológicas, que muitas vezes os alienam da sua realidade e os instrumentalizam. Eles fazem bem em querer explorar e conhecer o mundo, mas não devem deixar de cultivar suas relações com a comunidade de origem e de pertença, que lhes dá identidade e referência. Entre essas relações com a comunidade de origem está, especialmente, a relação com a família e o próprio círculo familiar. A relação com os adultos e os idosos é fator de equilíbrio e amadurecimento e ajuda a fazer um discernimento sereno e realista sobre o tempo e a História, os sonhos e a realidade.

Finalmente, Francisco dirige-se à própria comunidade eclesial, que precisa renovar sua relação com os jovens e, com seus múltiplos ambientes e iniciativas, proporcionar-lhes oportunidades para o encontro com Deus, o cultivo da fé e da virtude e para que eles possam testar seus sonhos em diversificadas formas de engajamento social e de amor ao próximo. A Igreja também precisa ajudar os jovens com o discernimento vocacional e a se perguntarem: o que Deus quer de mim? Por que me chamou à vida? Como fazer da vida um projeto bom para si e para os outros?

A falta de clareza vocacional acaba levando muitos jovens a gastarem o melhor de suas energias em descaminhos e futilidades, que não edificam e até levam a desperdiçar a vida. E não se trata apenas da vocação religiosa, mas também das escolhas profissionais e ocupacionais, bem como da constituição de uma família. Uma palavra especial é dita aos jovens ligados à Igreja: na vida, vista pela fé cristã, contam, sobretudo, o amor à família, a caridade social e a caridade política, expressões do envolvimento concreto na construção de uma sociedade nova, com os valores altos do respeito, da justiça e da solidariedade. *CARDEAL-ARCEBISPO DE SÃO PAULO

Opinião por DOM ODILO P. SCHERER