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Opinião|Presidenciáveis e a educação

Nenhum candidato situa a educação no centro da política econômica, como pilar para a formação de capital humano. A ficha ainda não caiu.

Atualização:

A julgar pelos planos apresentados, não são promissoras as perspectivas para a educação. No meio de tantos e gravíssimos problemas, é pouco razoável esperar prioridade para este setor. Mas é justamente a falta dessa prioridade que tornará difícil mudar os rumos da educação. Vamos às propostas.

Nenhum candidato à Presidência da República situa a educação no centro da política econômica, como pilar para a formação de capital humano. Simone Tebet é a que chega mais perto disso, ao propor uma política para a infância – o pressuposto é de que investir desde os primeiros anos é o melhor negócio. A educação é o pilar da formação de capital humano, mas a ficha ainda não caiu – nem mesmo entre os economistas que lideram esse plano.

Quanto às propostas dos dois principais candidatos, Jair Bolsonaro fala em continuar o que já estava fazendo e que ninguém sabe muito do que se trata; e Lula fala em consertar estragos, retrocessos e retomar a agenda do passado. Nenhum deles apresenta um plano ou indica prioridades.

Ciro Gomes tem fortes credenciais, em razão do inegável avanço da educação no Ceará. Seu plano não define prioridades, mas afirma que dará destaque especial ao setor. Fala grosso, apresenta meta ambiciosa: colocar a educação do Brasil entre as dez melhores do mundo em 15 anos. Mas decepciona ao apresentar sua única proposta: adotar o modelo do Ceará para o resto do Brasil. Nada errado com o modelo do Ceará – deu certo por lá e há estudos rigorosos que demonstram isso. Mas é preciso cautela. Primeiro, o Brasil não é o Ceará. Segundo, não existe um modelo único para nada – muito menos para a educação. Terceiro, o Ceará melhorou, mas essa média não está perto das dez melhores do mundo. Possivelmente, o modelo do Ceará seria adequado para quem está abaixo de um certo patamar. Modelo único, não dá.

Tebet bate na tecla certa: primeiro, é preciso reduzir a pobreza e cuidar das crianças. Se isso acontecer, será um bom começo para transformar a educação. Mas a ideia de criar um ministério para Crianças e Adolescentes dificilmente ajudará a atingir o objetivo – para implementar políticas intersetoriais, é preciso ter a chave do cofre – no planejamento ou na execução orçamentária. Ministro setorial não coordena ministro setorial. Já as propostas para a educação são muitas, sem prioridade ou foco. Caem na vala comum e tentam resgatar políticas e instrumentos do passado que não deram e não têm por que darem certo. Não sugerem prioridade, foco e a ruptura necessária para transformar a educação.

Entre os demais candidatos, a grande novidade vem da proposta de Luiz Felipe D’Ávila, centrada em dez grandes metas para o País – a educação é uma delas. Há um pouco de sonho: colocar o Brasil entre os 20 melhores do mundo em sete anos. Mas o plano tem substância. Demonstra conhecimento de causa.

Há 13 conjuntos de propostas concretas para a atuação do governo federal na educação. Destaco as que têm potencial transformador: usar mais incentivos e menos planos infalíveis, dinheiro para apoiar o que funciona, com evidências; refazer a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), sem a qual não há avanço possível; elevar o nível de entrada para futuros professores; facilitar o acesso dos pesquisadores às bases de dados do MEC – o que é essencial para qualificar o debate; reformular a governança das universidades públicas; e criar estímulos eficazes para promover a competitividade internacional da produção científica. Temos, aqui, um plano com foco e estratégias com potencial para mudar o Brasil e fazer a educação avançar.

Voltemos ao conjunto das propostas.

Todas elas dão algum destaque à educação profissional e tecnológica no ensino médio. Mas nenhuma delas coloca o dedo na ferida: é preciso alterar a legislação, reconhecer a especificidade do ensino médio, mudar a avaliação, estimular a participação do setor privado e articular com políticas de primeiro emprego. Essa área é crucial, e está emperrada há cinco anos – boas intenções não irão alterar o cenário, muito menos tentar implementar o novo ensino médio tal qual previsto na atual legislação.

Em três propostas, Bolsonaro, Lula e Tebet falam em cuidar dos estragos da pandemia. Um diz que vai continuar o que já teria começado (!); o plano de Lula não indicou o que se propõe a fazer; e as propostas de Tebet são vagas – quem é do ramo já sabe o que fazer. E não dá para perder mais um ano.

Bolsonaro, Tebet e Felipe D’Ávila falam em alfabetização das crianças. Bolsonaro diz que produziu um software, Tebet e D’Ávila repetem o erro de falar em alfabetização até o fim do 2.º ano – certamente, não é isso que fazem com seus filhos. Falar em alfabetizar no 2.º ano da escola é como vender produtos perecíveis com prazo de validade vencido. Não é com esse tipo de ideia que se faz uma revolução na educação.

Resta esperar pelos planos dos governos estaduais. Diferentemente do governo federal, governadores estão mais próximos do mundo real, pois precisam operar escolas. Quem sabe teremos surpresas por aí?

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PRESIDENTE DO INSTITUTO ALFA E BETO 

Opinião por João Batista Araújo
Oliveira