
05 de maio de 2016 | 03h00
Não deveria causar espécie que assim seja, pois é essa a qualidade de um Congresso que é eleito e se organiza conforme um sistema que facilita a fragmentação político-partidária, pulverizando sua representatividade e multiplicando o número de clientes no balcão de negócios estatais. Mesmo assim, a picaretagem política, alimentada com denodo pelo lulopetismo na última década e meia, não pode ser encarada como um fado. Temer tem o dever de fazer o possível e um pouco mais para que seu governo seja diferente daquele que o antecedeu e que envergonha o País.
As filas de políticos na entrada do Palácio Jaburu, residência do vice-presidente, até têm causado congestionamentos. Temer, é claro, se dispõe a conversar com todos, abrindo a perspectiva de uma ampla aliança, o que, em si, já é muito distinto do que fazia o governo petista, que se limitou a comprar, em dinheiro vivo, o apoio de que necessitava, tudo para não ter de compartilhar o poder.
O problema é que a porta da casa de Temer virou porteira, pela qual passa o boi, mas também passa a boiada. O vice-presidente, que havia acenado com um Ministério de “notáveis” e que se comprometera a reduzir o número de pastas das atuais 31 para cerca de 20, já admite que cortará “no máximo uns três Ministérios”, segundo O Globo. Temer atribui suas dificuldades à resistência dos setores afetados pelas mudanças, mas é claro que o problema é mais rasteiro: trata-se de ter vagas suficientes para acomodar os apadrinhados dos partidos que se dispõem a dar uns quantos votos no Congresso para apoiar o governo.
Disso resulta uma mixórdia ministerial, que inclui a possibilidade de entregar Ciência e Tecnologia para um bispo da Igreja Universal que repudia o darwinismo, de manter os Transportes nas mãos do PR – partido cujo presidente cumpre prisão domiciliar por envolvimento no mensalão – e de dar a Saúde e a Agricultura, Ministérios de grande destaque, para o PP, até outro dia sócio do PT no petrolão.
Mesmo dentro do PMDB já há quem tenha precificado seu apoio ao novo governo. Os peemedebistas da Câmara, por exemplo, ameaçam se rebelar caso não sejam bem representados no Ministério. Para que se acalmem, querem a pasta do Desenvolvimento Social, apelidada de “Ministério do Bolsa Família”, que tem bom potencial clientelista.
Além disso, Temer vai sofrer ainda para escolher ministros que não estejam sendo investigados pela Justiça. Um exemplo é o peemedebista Romero Jucá, principal articulador do novo governo. Cotado para o Planejamento, o senador é alvo das operações Lava Jato e Zelotes. Temer disse à TV Globo que não vê problema, pois se trata apenas de uma investigação. “Não sei se isso é um fator impeditivo”, ponderou. Evidentemente deveria ser.
Assim, não são auspiciosos os primeiros sinais emitidos pelo grupo político que está prestes a chegar ao poder. Temer deveria aproveitar o apoio de que desfrutará logo que ocupar a Presidência para deixar claro que, na nova administração, ao menos as funções críticas para a retomada do crescimento e da confiança estarão protegidas da sanha dos políticos descomprometidos com o País. Do contrário, estará fadado ao mesmo fracasso que condenou a presidente Dilma Rousseff, o chefão Luiz Inácio Lula da Silva e o PT à lata de lixo da história.
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