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A carga tributária

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Por Redação
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Não há motivo para comemorar a queda da carga tributária para 34,28% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2009, um recuo de 0,57% em relação ao ano anterior, anunciada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em nota técnica que obedece à metodologia do IBGE para o cálculo das contas nacionais. Isso ocorreu graças a desonerações tributárias para estímulo ao consumo, e ninguém duvida, nem mesmo o Ipea, que a carga tributária voltará a crescer. Isso não só porque o prazo de concessão de reduções de impostos termina este mês, como porque o atual governo abandonou a veleidade, porventura existente, de realizar uma reforma fiscal. Além disso, há que considerar que a carga deve elevar-se em razão da expansão da massa salarial tributável. A nota do Ipea destaca que o total só não teve uma queda maior em 2009 porque se verificou um volume mais substancial de recolhimentos do FGTS e de contribuições previdenciárias. Como a formalização do trabalho vem-se intensificando, essa tendência deve se refletir no cálculo da carga tributária.Do ângulo social, essa evolução é positiva, mas o governo não admite nem pensar em redução de impostos sobre a folha de pagamento, para facilitar a empregabilidade no setor privado. Isso exigiria primeiro que o governo contivesse os seus gastos correntes. As autoridades, vez por outra, prometem cortar despesas orçamentárias, mas são promessas vazias, tanto mais em um ano eleitoral.O governo central vai investir tudo o que puder nas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para dar ensejo a festivas inaugurações. As mais fortes pressões, contudo, virão do custeio da máquina administrativa, em decorrência de benefícios, como aumento de salários a servidores dos Três Poderes, cujo número, por sinal, só faz aumentar. Como tributaristas não se cansam de prevenir, este é o caminho mais curto para uma crise fiscal.Com base nos resultados das contas públicas neste início de ano, não é provável a eclosão de uma crise desse tipo. As contas do setor público (União, Estados e municípios e empresas estatais, excluída a Petrobrás) apresentaram um superávit de R$ 16,18 bilhões em janeiro deste ano, de acordo com dados do Banco Central. Esse valor corresponde a um superávit primário de 6,07% do PIB. Observe-se, porém, que se trata de um mês apenas. Nos últimos 12 meses findos em janeiro, o superávit primário foi de 2,32% do PIB, muito aquém da meta para o ano, de 3,3% do PIB. A relativa melhora das contas públicas foi possível graças ao forte aumento da arrecadação. As receitas federais alcançaram R$ 73,02 bilhões em janeiro, acusando um crescimento real de 13,64% em relação ao mesmo mês de 2009. Esses dados atestam o grau de aquecimento da economia, mas há que considerar também que, em janeiro, a arrecadação é favorecida pela antecipação de recolhimentos devidos por ajustes anuais das empresas.Fevereiro foi um mês ainda mais surpreendente. A arrecadação federal foi de R$ 53,54 bilhões, recorde para o mês. Devido a um menor número de dias úteis do mês, a receita em fevereiro registrou uma queda de 27,25% diante de janeiro, mas, em comparação com fevereiro do ano passado, houve um acréscimo de 13,23% em termos reais. Apesar disso, chegar à meta fiscal não vai ser fácil, embora a economia possa avançar neste ano a uma taxa de 5,7% e a arrecadação, a 12%, em média, segundo projeções oficiais. Ou seja, a economia reage e é bom o funcionamento da máquina arrecadadora. Em vista disso, não há nem mesmo uma justificativa técnica para os projetos encaminhados ao Congresso, dando à Receita Federal poderes de polícia e judiciais, além de tratar todos os contribuintes como sonegadores.Não é por aí que o governo conseguirá cumprir, sem truques contábeis, a meta do superávit primário este ano. Espera-se que as autoridades não se deixem entusiasmar pela alta da arrecadação e adotem medidas vigorosas de austeridade fiscal, de modo a cumprir o que os ministros da área econômica prometem. O presidente Lula deve esse esforço à Nação, em seu último ano de governo.