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A chantagem como argumento

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Por Redação
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Só a certeza da impunidade justifica a desfaçatez com que, a qualquer pretexto, os 7,5 mil metroviários de São Paulo transformam em seus reféns pelo menos 3 milhões de habitantes da cidade. Não faz dois meses que eles paralisaram São Paulo. Muitos dos que sofreram as danosas conseqüências da greve de junho ainda nem tiveram tempo de esquecer as dificuldades por que passaram e já estão sendo novamente transformados, como toda a cidade, em vítimas de uma ação sindical que não pode receber outra designação senão chantagem. É disso, de fato, que se trata. Metroviários fazem greve por razões que a sociedade não consegue entender, nem muito menos aceitar. No ano passado, interromperam os serviços, causando grandes problemas para o tráfego na cidade e prejudicando seus milhões de usuários, apenas porque não concordavam com os termos do contrato de transferência, para uma empresa particular, da operação da futura Linha 4. Agora em junho, fizeram uma paralisação de 13 horas, mesmo depois de fechado com a Companhia do Metrô um acordo de aumento salarial, num sinal claro de desrespeito aos milhões de usuários e a toda a população de São Paulo. Agora, usaram a ameaça de greve para chantagear o Metrô com o objetivo de arrancar da empresa tudo o que querem a título de participação nos resultados, benefício inscrito na Constituição e regulamentado por uma medida provisória editada em 1994 e transformada em lei em 2000. Esses instrumentos legais referem-se a participação nos lucros ou resultados conseguidos pelas empresas privadas. Não se pode, no caso de uma empresa pública, como é a Companhia do Metrô, falar em lucros, daí os metroviários reivindicarem participação nos resultados. Para os contribuintes, que recolhem os tributos, e os usuários, que pagam as tarifas, não é compreensível que uma empresa com crônicas dificuldades financeiras, como é o caso do Metrô, distribua entre seus empregados, a título de participação nos resultados (negativos), o dinheiro que falta para obras de expansão das linhas no ritmo exigido pelo crescimento da cidade e para a manutenção dos serviços. Reconheça-se, mesmo assim, o direito dos metroviários, que, em negociações anteriores, fixaram critérios, entre os quais metas de desempenho, para a concessão do benefício. O problema é a transformação dessas metas em valores monetários. Os metroviários exigiram o equivalente a uma folha e meia de salário, valor a ser dividido igualmente entre eles. O Metrô ofereceu, em contrapartida, o pagamento proporcional do benefício, na base de 60% do salário mais um valor fixo de R$ 1.250 para todos os empregados. Qualquer que seja o resultado das negociações, seu custo será pago pela sociedade. Tendo, finalmente, notado os enormes sacrifícios que impõem à população com as greves que organizam com tanta freqüência, dirigentes do Sindicato dos Metroviários procuraram se explicar antecipadamente, garantindo que, ao colocarem sobre a mesa de negociações a ameaça de realizar nova greve, não o fizeram "com a intenção de prejudicar a população". Isso é uma balela. Greve de metroviários sempre prejudica, e muito, a população, quaisquer que sejam as intenções dos grevistas. No caso da participação nos resultados, os metroviários sabem que quanto maior for sua pressão, sobretudo usando a população como refém, maior será seu ganho, visto que a empresa não pode recorrer à Justiça do Trabalho, que não tem competência para atuar nesse caso. O tema, segundo a legislação, tem de ser tratado exclusivamente por empregados e empregadores. A prestação de serviços públicos, porém, é regulada por leis que precisam ser cumpridas. Esses serviços devem obedecer a cinco princípios, que são a sua manutenção ao longo do tempo, a oferta a todos de maneira indiscriminada, a eficiência, o custo tolerável e a cortesia. É dever das autoridades agir para impedir sua interrupção e intervir para restabelecê-los ou regularizá-los quando interrompidos. Se a interrupção se dever a greves que não cumprem os requisitos legais, entre os quais o prévio aviso aos usuários e a preservação de um mínimo de serviços, os responsáveis pelo movimento devem ser punidos.