31 de março de 2012 | 03h08
O espetáculo será ainda mais divertido para quem se lembrar de um evento recentíssimo. China e Estados Unidos ficaram do mesmo lado, quando o Brasil tentou provocar na Organização Mundial do Comércio (OMC) um debate sobre a manipulação cambial e seus efeitos nas trocas internacionais. Americanos e chineses fizeram o possível para matar a discussão e trabalharam para transferir o assunto para a reunião do G-20.
Como de costume, nenhuma decisão consequente a respeito do câmbio deverá resultar do encontro no México. A reunião das 20 principais potências desenvolvidas e emergentes poderá ser um sucesso por algum outro motivo - especialmente se contribuir para a superação da crise europeia. Um passo importante para isso é a decisão dos governos europeus de elevar de 500 bilhões para 700 bilhões os recursos disponíveis para ajuda a políticas de estabilização. Isso deverá facilitar o trabalho do FMI de coletar dinheiro dos emergentes para operações de socorro aos próprios europeus.
O G-20 perdeu muito de sua capacidade de mobilização desde a superação da primeira fase da crise internacional. Mas ainda é mais relevante que o grupo Brics, formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. O despreparo desses países para ações conjuntas de grande alcance foi mais uma vez confirmado na reunião de cúpula de Nova Délhi, na quarta e na quinta-feira. O grupo é novo e isso poderia, talvez, explicar o escasso valor prático das confabulações de seus ministros e chefes de governo. Mas o problema é muito mais sério. Esses países partilham poucos interesses com suficiente importância para transformá-los em aliados ou para levá-los a constituir um bloco. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou os grandes emergentes como aliados estratégicos, mas nunca houve reciprocidade efetiva. Ao contrário: preteriram o Brasil mais de uma vez, em suas ações diplomáticas e comerciais, e sempre deram mais importância a entendimentos com parceiros regionais ou com as potências do mundo rico.
Não houve surpresa na retórica balofa da Declaração de Nova Délhi, recheada de manifestações de preocupação com a crise internacional, cobranças dirigidas a europeus e americanos - como se estes se importassem - e apelos a soluções pacíficas para a crise no Oriente Médio, para a matança na Síria e para os desentendimentos entre o Ocidente e o Irã. Nada, nesse documento, é leitura indispensável.
Seus 50 artigos chochos se completam com um Plano de Ação de Nova Délhi. Os quatro primeiros itens se referem a encontros ministeriais "à margem" de reuniões da ONU, do FMI e de outros eventos multilaterais. Encontros "à margem" de eventos oficiais importantes são rotineiros há muito tempo. O resto chega a ser mais fraco. Muito mais emocionante pode ser uma ata da reunião de um clube de dominó.
Correção - O editorial de ontem O desafio depois da cura contém imprecisões no título e no texto. No caso, não se trata de cura do câncer, mas de remissão da doença.
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