Imagem ex-librisOpinião do Estadão

A crise da Santa Casa

Exclusivo para assinantes
Por Redação
3 min de leitura

A possibilidade de a Santa Casa de São Paulo fechar no fim deste mês o seu pronto-socorro, que atende mais de mil pacientes por dia, por causa de grave crise financeira chama mais uma vez a atenção para as sérias dificuldades com que essa e outras instituições filantrópicas se debatem há anos. Como elas são de importância fundamental para o sistema público de saúde, do qual depende a população de baixa renda, é justo que recebam, como deseja a Santa Casa, a ajuda dos governos federal, estadual e municipal, necessária para que possam resolver seus problemas.A situação financeira da Santa Casa, equilibrada em 2009, agravou-se em 2010, quando sua dívida chegou a R$ 80 milhões, e continuou a piorar neste ano, quando atingiu R$ 120 milhões. Sem condições de, por meios próprios, honrar essa dívida, ela concluiu realisticamente que, ou conta com a ajuda do poder público, ou não terá como evitar o fechamento de um serviço fundamental como o pronto-socorro. Isso porque, como explicou ao Estado o superintendente do hospital da Santa Casa, Antônio Carlos Forte, o atendimento eletivo é possível controlar, para tentar remediar a situação, mas não o pronto-socorro.São várias as razões pelas quais se chegou a essa situação, segundo ele. Uma delas é o aumento de 30% nos atendimentos pelo pronto-socorro, que pode ser explicado pelo fato de grande parte dos resgates feitos pela Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros estar sendo encaminhada para esse serviço. São pacientes com graves traumas, que necessitam de cirurgia e internação, e cujo atendimento, por isso, é muito caro. Outro motivo de grande peso, que há muito tempo está por trás das dificuldades de todas as instituições filantrópicas da área de saúde, é a bem conhecida - mas nunca corrigida - defasagem da tabela de procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS), pelo qual são feitos todos os atendimentos da Santa Casa.O SUS cobre em média apenas 60% dos gastos. A Santa Casa tenta há anos cobrir os restantes 40% com o lucro obtido pelo Hospital Santa Isabel - que é a sua unidade privada de saúde - e com o aluguel de cerca de 300 imóveis que a instituição possui em São Paulo. "Mesmo assim, a conta não fecha", afirma Forte. O responsável por essa causa permanente de dificuldades é a União, que nunca cumpriu as promessas de corrigir a tabela do SUS.Por isso, é incompreensível - para dizer o mínimo - a posição assumida pelo secretário de Atenção à Saúde, do Ministério da Saúde, Helvécio Magalhães, depois de anunciar a criação de uma equipe tripartite (governos municipal, estadual e federal) para analisar as finanças do hospital da Santa Casa: "Vamos fazer uma radiografia para apresentar ao ministro Alexandre Padilha. Não adianta de tempos em tempos apresentarem uma conta com uma dívida imensa. O problema não é só a tabela do SUS. Há outros aspectos. Pode haver problemas de gestão".Que o problema não é exclusivamente do SUS o próprio superintendente Forte reconhece, como se viu. Mas levantar, vagamente, a hipótese da existência de problemas de gestão na Santa Casa e nada dizer sobre a necessidade de reavaliar a tabela do SUS deixam a impressão de que o governo federal acha natural pagar 60% dos gastos e deixar que a Santa Casa "se vire" - para usar uma expressão popular - para encontrar os recursos destinados aos outros 40%. Ela e outras instituições filantrópicas vêm se esforçando há muitos anos para cobrir esse buraco, mas nem sempre isso é possível. Daí as repetidas crises enfrentadas por elas.Ao ajudá-las, o governo federal - da mesma maneira que o municipal e o estadual, chamados a colaborar, o que este último já faz - não faz nenhum favor. As Santas Casas, especialmente a de São Paulo, tendo em vista seu porte e a qualidade de sua administração, são responsáveis por parte importante dos atendimentos do SUS. Estima-se que no Estado de São Paulo elas respondem por mais da metade das internações do SUS.Estamos diante de um grave problema de interesse público. Ajudar a Santa Casa é ajudar a rede de saúde pública, o que é obrigação da União, do Estado e do Município de São Paulo.