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A crise de humor do brasileiro

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Por Redação
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O varejo político é o único mercado com alguma animação no Brasil. Os outros vão muito mal, mas a presidente Dilma Rousseff parece desconhecer esse detalhe. Ela pode obter algum apoio parlamentar em troca de Ministérios, postos de segundo e terceiro escalões e outras bondades, mas precisará de muito mais que isso para mudar o humor dos chamados cidadãos comuns. Já tentou oferecer mais crédito, mas poucos empresários e consumidores se dispuseram a buscar novos empréstimos. Ninguém deveria surpreender-se. Para conhecer melhor o estado de espírito dos brasileiros a presidente deveria examinar alguns números. Exemplo: o medo do desemprego atingiu em março o nível de 106,5 pontos, o segundo maior da série iniciada em 1999. Só em julho daquele ano foi registrado um resultado pior. Nos últimos 12 meses, o indicador subiu 7,8%, acompanhando a piora do cenário econômico. Os dados são de pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Esse levantamento foi divulgado ontem de manhã. Ao mesmo tempo, um novo relatório sobre o aperto das empresas foi distribuído pela Serasa Experian, empresa especializada em informação financeira. De janeiro a março foram requeridas 409 recuperações judiciais, total 114,1% maior que o de um ano antes. Foi o maior número acumulado num primeiro trimestre desde a entrada em vigor, em 2005, da nova Lei de Falências. Os pedidos de falência nos primeiros três meses, que somaram 391, foram 14,3% mais numerosos que os do mesmo período de 2015.

A piora do humor dos brasileiros e o aumento dos pedidos de recuperação judicial são indicadores de um quadro econômico em deterioração. O agravamento das condições econômicas iniciou-se no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, com a desordem crescente das contas públicas, a tolerância à inflação, os muitos erros da política industrial. A pilhagem da Petrobrás, o aspecto mais visível da ocupação predatória do aparelho estatal, havia começado bem antes, já no início da gestão petista, com o aparelhamento e o loteamento da administração federal direta e indireta.

O número positivo de 2014, um mísero crescimento econômico de 0,1%, nem chegou a disfarçar o começo da recessão. Com o desastre de 2015, quando o Produto Interno Bruto (PIB) diminuiu 3,8%, todos os problemas foram escancarados. Vários indicadores continuaram piorando neste ano e as estimativas, por enquanto, são de uma contração econômica próxima de 3,7%, mas a partir de uma base já rebaixada no ano passado.

Um desses indicadores, divulgado no fim de março, foi produzido pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. De acordo com esse levantamento, o desemprego chegou a 9,5% no trimestre de novembro a janeiro, com 9,6 milhões de pessoas desocupadas. Um ano antes os desempregados ainda eram 6,8% da população ativa. Já era um número bem maior que os de várias economias desenvolvidas, como a americana, a alemã e a britânica, e a partir daí as condições da economia entrariam em rápida decomposição.

A percepção de um mercado de emprego cada vez mais apertado e mais inseguro tem afetado severamente as perspectivas econômicas dos cidadãos e das famílias. Em março, de acordo com uma pesquisa também promovida pela CNI, o índice nacional de expectativa do consumidor voltou a cair. Ficou em 97,6 pontos, 11% abaixo da média histórica. Segundo o relatório, as avaliações dos entrevistados foram influenciadas pelo pessimismo em relação ao emprego e pela percepção da piora da própria condição financeira.

A deterioração da renda está vinculada à piora do mercado de trabalho, com maior desemprego e reajustes salariais menores, e também à inflação. O aumento de preços passou de 10% no ano passado, erodiu severamente as finanças dos consumidores e continua corroendo seus ganhos. Com a recessão, prevê-se para 2016 uma inflação menor, mas ainda acima de 7% e muito alta por qualquer padrão. Quem pode ainda ser otimista?