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A crise no coração do euro

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Por Redação
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A crise de confiança chegou afinal ao coração da Europa, a Alemanha, maior economia do bloco e sócio mais importante da união monetária. O sinal de alerta soou na quarta-feira, quando o Tesouro alemão só conseguiu vender 65% dos títulos no valor de 6 bilhões oferecidos ao mercado. Pouco antes o governo alemão havia rejeitado um plano da Comissão Europeia (CE) para salvar o euro. As divergências políticas dificultam cada vez mais uma solução ampla para os problemas fiscais e financeiros da região. O desafio, agora, já não é salvar este ou aquele país, mas preservar o bloco monetário ou talvez a integridade da própria União Europeia, como comentou em artigo reproduzido no Estado o historiador Niall Ferguson, de Harvard. Com pequenas variações, preocupações semelhantes são manifestadas pelos mais importantes eurocratas. "O custo de uma ação tardia já tem sido muito alto", disse nessa quinta-feira o presidente da CE, José Manuel Barroso. Mas o perigo maior está à frente: "O custo de não agir é a fragmentação", advertiu. A Europa está a um passo de uma recessão e dados econômicos assustadores complicam o cenário dos desacertos políticos. A economia da zona do euro cresceu no terceiro trimestre em ritmo equivalente a 0,2% ao ano. Nessa quarta-feira novos dados confirmaram um quadro dramático. As encomendas à indústria nos 17 países da união monetária caíram 6,4% de agosto para setembro. Nem as maiores economias da área escaparam da retração. As encomendas de bens industriais diminuíram 4,4% na Alemanha, 6,2% na França e 9,2% na Itália. A perspectiva de uma recessão torna mais preocupante a situação dos países mais endividados e com maiores problemas fiscais. Quanto menor o crescimento da economia, mais difícil a arrecadação de impostos, mesmo com aumento da tributação. O mero corte de gastos dificilmente garantiria a arrumação das contas públicas. Por isso as autoridades do bloco, apoiadas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), vinham recomendando uma diferenciação de políticas.Governos com menor espaço de manobra deveriam concentrar-se nas medidas de austeridade, enquanto aqueles com alguma folga tentariam manter algum estímulo ao crescimento. As economias mais sólidas dariam algum alento às demais. Se forem tragadas pela recessão, Alemanha e França pouco poderão fazer para puxar as economias em pior estado. Se não surgir um acordo político salvador, caberá ao Banco Central Europeu (BCE) a maior parte do esforço de reanimação da economia. Sob nova direção, o BCE já reduziu a taxa básica de juros de 1,5% para 1,25% ao ano. Foi o ato de estreia do economista Mario Draghi na presidência da instituição. E economistas do setor financeiro esperam novos cortes. Enquanto isso, o BCE continua comprando no mercado secundário papéis emitidos por governos. Com isso dá aos Tesouros alguma proteção, enquanto os investidores cobram juros perigosamente altos para rolar dívidas soberanas. Mas não só os governos estão em apuros. Bancos europeus têm tido dificuldade para obter financiamento, especialmente em dólares. O BCE, segundo se informou nessa quinta-feira, estuda a ampliação do prazo de empréstimos aos bancos de um ano para dois ou três.A proposta de criação do eurobônus, apresentada na quarta-feira pela Comissão Europeia, foi rejeitada pelo governo alemão. É inaceitável, segundo parlamentares da União Democrata Cristã, partido da chanceler Angela Merkel. Os bônus, de acordo com a proposta, substituiriam os papéis dos países mais endividados e com maior dificuldade para levantar financiamentos no mercado. A credibilidade dos Tesouros em melhor situação funcionaria como aval desses títulos. Reunidos em Estrasburgo, a chanceler alemã, o presidente francês, Nicolas Sarkozy, e o novo primeiro-ministro da Itália, Mario Monti, anunciaram a intenção de propor nas próximas semanas um plano para integração das políticas econômicas e imposição de maior disciplina fiscal. A salvação do euro e a integridade do bloco dependem de mais que isso: centenas de bilhões de euros e ação rápida.