08 de novembro de 2015 | 03h00
Por converter planejamento tributário em crime fiscal, suprimir direitos dos contribuintes e abrir caminho para o arbítrio fiscal, a exclusão desses dispositivos da MP 685 já era dada como certa nos meios empresariais. Entidades empresariais já haviam avisado que, se o Legislativo não os derrubasse, elas questionariam sua constitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF). Sem esperar pela votação, o Partido Socialista Brasileiro (PSB) recorreu aos tribunais, alegando que essa MP viola três garantias fundamentais – o direito de defesa, o devido processo legal e a presunção de inocência. O PSB também afirmou que vários artigos da MP 685 tratam de matéria penal, o que é vedado a medidas provisórias.
Editada como parte do programa de ajuste fiscal lançado pelo ministro Joaquim Levy, a MP 685 foi concebida com o objetivo de reduzir o direito das empresas de questionar administrativamente autuações do Fisco e de obrigá-las a pagar impostos em litígio. Numa atitude desastrada, o Ministério da Fazenda divulgou, com o propósito de constrangê-las, os nomes das empresas que mais discutem seus débitos fiscais na esfera administrativa.
Por isso, a MP 685 foi mal recebida nos meios empresariais e jurídicos. Ao tentar defendê-la, o ministro da Fazenda alegou que, ao obrigar as empresas a justificar seu planejamento tributário e reduzir o questionamento administrativo das autuações das autoridades fiscais, o governo pretendia “gerar economia de recursos públicos em litígios desnecessários e demorados”. Também afirmou que o acesso ao planejamento tributário das empresas “oferece ao governo oportunidade de responder rapidamente aos riscos de arrecadação tributária por meio de fiscalização ou mudança na legislação”. E disse, ainda, que “inspirou-se” nas recomendações de organismos multilaterais, quando encomendou a redação da MP 685. Os argumentos de Levy eram tão carentes de fundamentação jurídica que um ministro do STF – Gilmar Mendes – os classificou como “falsas espertezas”.
Críticas semelhantes foram formuladas no Legislativo durante a votação da MP 685. “Elisão fiscal é prevista em lei e não é ilegal”, disse o deputado Bruno Covas (PSDB-SP), questionando os vícios de inconstitucionalidade da medida provisória. Até líderes da base aliada, como o deputado Ricardo Izar (PSD-SP), criticaram duramente o governo, reclamando que não se pode aumentar a receita tributária “asfixiando a população” por meio de expedientes fiscais imorais e ilegais. Líderes de partidos beneficiados na reforma ministerial feita por Dilma invocaram o mesmo argumento para liberar seus deputados para votar contra o arbítrio.
A derrota do governo mostra mais uma vez que, na democracia e no Estado de Direito, não dá para aumentar a arrecadação a qualquer preço como imaginou o ministro da Fazenda quando propôs que contribuintes fossem obrigados a expor seus procedimentos tributários e defendeu a tese de que eles podem ser punidos sem direito de se defender, uma vez que suas declarações poderiam ser tomadas como confissão pelo Fisco. Por mais que o governo precise aumentar a arrecadação para equilibrar suas contas, no Estado de Direito as autoridades fazendárias não podem mudar as regras do jogo conforme suas conveniências nem desprezar os direitos constitucionais dos contribuintes. Essa é a lição que as autoridades fazendárias precisavam aprender.
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