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A desfiguração da MP 472

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Por Redação
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A versão desfigurada da Medida Provisória (MP) n.º 472 aprovada no Senado na terça-feira é um exemplo de como, em ano eleitoral, os congressistas, com a colaboração do Executivo, tratam - ou melhor, destratam - temas de interesse público. Além de manter os benefícios previstos na versão original, o texto aprovado amplia o alcance do programa de refinanciamento de dívidas com a União criado no ano passado - que ficou conhecido como "Refis da Crise" -, perdoa R$ 1,6 bilhão em dívidas de pequenos produtores rurais, autoriza o Tesouro a aplicar R$ 1 bilhão no Banco do Nordeste do Brasil (BNB) e recria o parcelamento das dívidas de crédito-prêmio do IPI com redução de encargos, que era permitido por medida provisória anterior, cuja validade se esgotou em março.É um injustificável festival de bondades tributárias promovido pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), que, na condição de relator da MP 472 na Casa, acrescentou mais de 50 emendas ao texto aprovado anteriormente pela Câmara dos Deputados.Fruto da notável criatividade legiferante do governo, a MP 472 contrariou as boas técnicas legislativas ao incluir, num único texto, um grande número de temas díspares. Editada às pressas no fim do ano, a MP trata de assuntos tão variados como a instituição de um regime especial de incentivos para o desenvolvimento da infraestrutura da indústria petrolífera no Norte, Nordeste e Centro-Oeste, a criação do Programa Um Computador por Aluno, a prorrogação de benefícios fiscais, a capitalização do BNDES, o ajuste do Programa Minha Casa, Minha Vida e ainda "dá outras providências".Para atender ao maior número possível de interesses típicos do período pré-eleitoral, negociados com parlamentares da situação e da oposição, Jucá elaborou uma longa lista de acréscimos ao projeto de conversão que já havia sido aprovado pela Câmara. Sem maiores discussões, o plenário aprovou todos os acréscimos.Uma das emendas mais polêmicas é a que amplia a possibilidade de refinanciamento de dívidas de contribuintes com a União. Ela estabelece que dívidas junto a autarquias e fundações públicas federais e débitos de qualquer natureza com a Procuradoria-Geral da Fazenda poderão ser pagos ou parcelados em até 180 meses. A regra vale para créditos do governo inscritos ou não na dívida ativa, mesmo que estejam com execução fiscal já ajuizada.Trata-se de uma ampliação do Refis da Crise. Criado pelo governo para aliviar empresas com dificuldades provocadas pela crise financeira internacional, esse programa foi aprovado em maio e esteve aberto para adesões até 30 de novembro passado. É o programa de refinanciamento de débitos tributários mais generoso dos quatro já colocados em prática. Importantes para contribuintes com dificuldades financeiras temporárias, programas desse tipo têm sido, porém, muito mais utilizados por contumazes sonegadores e maus pagadores de tributos. A instituição de mais um estimulará o não recolhimento de tributos.A justificar essa emenda, Jucá disse à repórter Edna Simão, do Estado, que "não é um novo Refis". Trata-se, segundo ele, apenas da inclusão, no programa de refinanciamento, das dívidas com autarquias e fundações. Na interpretação de tributaristas, porém, esta é uma brecha para a extensão do benefício para outras dívidas. No caso das dívidas de produtores rurais com o BNB, Jucá atendeu a reivindicações de senadores nordestinos, tanto da base governista como da oposição. Suas emendas permitem, entre outras vantagens, a redução das dívidas referentes a recursos originários do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste e do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).Como a versão aprovada pelo Senado difere da que passou pela Câmara, o projeto de conversão da MP 472 terá de ser novamente votado pelos deputados. O Congresso tem de votar a MP 472 em caráter definitivo até o dia 25 de maio. É quando termina o prazo de vigência da MP, que já foi prorrogado por 60 dias pela Mesa do Congresso.