21 de outubro de 2013 | 03h05
A Transnordestina é um caso exemplar da desconexão entre discurso e realidade nos governos petistas. A ferrovia, de 1.728 km, que ligará o sertão do Piauí aos litorais do Ceará e de Pernambuco, começou a ser construída em 2006, com a sua conclusão prometida para dezembro de 2010. Logo, se o último prazo anunciado for finalmente cumprido, terão sido quase seis anos de atraso.
Tal vexame não é um fato isolado numa área crucial para o desenvolvimento do País. O próprio ministro dos Transportes, César Borges, admitiu que o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) executou apenas R$ 7 bilhões do orçamento de R$ 15 bilhões para este ano.
Borges atribuiu essa situação a uma série de entraves, como projetos mal elaborados, demora na concessão de licenças ambientais, disputas judiciais e exigências do Tribunal de Contas da União, cuja tarefa é apontar indícios de sobrepreço. Para o ministro, esses obstáculos legais afugentam as empreiteiras, que "reclamam que não há segurança jurídica", e "isso faz com que nós fiquemos meses, anos com problemas" - como se esses obstáculos não fossem causados, em primeiro lugar, pelo próprio governo.
As obras da Transnordestina começaram a atrasar em razão da liberação irregular de verbas e graças às dificuldades para realizar desapropriações. Houve casos em que o governo ofereceu entre R$ 6 e R$ 140 de indenização a agricultores que tiveram suas terras cortadas pela ferrovia. O Dnit nega que esses valores pífios estejam errados - o que evidencia os equívocos desse processo.
Enquanto isso, o preço da obra não para de subir. A ferrovia foi inicialmente orçada em R$ 4,5 bilhões. Na época, esse valor foi considerado muito inferior ao real, pois as primeiras projeções indicavam que seria necessário algo em torno de R$ 8 bilhões. Mas o governo exigiu mudanças no projeto, de forma a barateá-lo. Em 2010, no entanto, houve o primeiro reajuste do custo, para R$ 5,4 bilhões.
Quando Dilma visitou as obras, em 2012, ela disse ter "certeza" de que as projeções sobre o valor estavam "bem próximas da realidade" e que seu governo não pretendia "ficar elevando indefinidamente o preço dessa ferrovia". A certeza durou apenas 15 meses: em maio passado, a estimativa para a Transnordestina saltou para R$ 7,5 bilhões. Como o contrato é reajustado pela inflação, especula-se que o custo já tenha superado R$ 8 bilhões.
O ministro Borges defendeu os aumentos nos contratos: "Às vezes parece que os aditivos são uma coisa criminosa, mas os aditivos existem porque existe a realidade". O problema é que a "realidade" à qual o ministro se refere é menos um eventual aumento de custos criado por imprevistos e mais a incapacidade do governo de tirar seus projetos do papel.
A Transnordestina é uma obra estratégica. Com capacidade para transportar cerca de 30 milhões de toneladas por ano, a ferrovia permitirá que os produtores do Nordeste ganhem tempo e economizem recursos, pois evitarão o custoso transporte por caminhão e poderão escoar seus produtos por portos da região, sem depender de terminais do Sudeste. O investimento, portanto, é urgente. O que se espera do governo é que, sem mais delongas, simplesmente cumpra o que prometeu.
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