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A gastança é intocável

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Por Redação
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O governo federal não vai apertar o cinto, embora a nova previsão de receita indique um quadro pior que o estimado no fim do segundo bimestre. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, ainda falava, há poucos dias, sobre possível corte de gastos como acomodação aos efeitos da crise. Mas a ideia foi rapidamente abandonada. A receita agora estimada para 2009, de R$ 561 bilhões, é R$ 3,3 bilhões menor que a projetada depois de encerrado o segundo bimestre. A perspectiva tem piorado a cada revisão. A diferença para menos já alcança R$ 56,4 bilhões em relação ao valor previsto no orçamento aprovado pelo Congresso Nacional. A terceira revisão bimestral do orçamento foi divulgada na segunda-feira. Excluído o valor das contribuições à Previdência, a nova estimativa da receita primária fica R$ 7,3 bilhões abaixo da anterior. A diferença é explicada principalmente pela perda agora esperada na arrecadação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Do lado das despesas obrigatórias, o governo prevê uma redução muito pequena, de apenas R$ 406,7 milhões, decorrente de uma estimativa menor dos subsídios. Para justificar a decisão de manter a programação de gastos, o governo aponta uma elevação provável de ingressos não administrados pela Receita Federal: o valor agora previsto é R$ 4,1 bilhões maior que o projetado no relatório bimestral divulgado em maio. A parcela relativa a dividendos aumentou R$ 3 bilhões, de R$ 13,7 bilhões para R$ 16,7 bilhões. Em outras palavras, o governo, como já se havia divulgado há alguns dias, está recorrendo a um volume crescente de receitas não tributárias para custear os gastos correntes. Na prática, está usando esse dinheiro para continuar elevando as despesas de custeio, como as da folha de salários. Despesas desse tipo são normalmente irredutíveis. Dado o padrão gerencial do governo petista, são também improdutivas. O vínculo entre mais empregos públicos, mais salários e mais e melhores serviços à população só existe no discurso dos defensores do empreguismo e do aparelhamento. A novidade, agora, é a demonstração de maior irresponsabilidade financeira: depender de receitas não administradas - como dividendos de estatais - para os gastos correntes é assumir um novo tipo de risco. É mais uma demonstração do pior tipo de criatividade. A nova projeção dos dividendos é baseada, em parte, numa reestimativa do preço internacional do petróleo. O valor médio calculado para 2009 subiu de US$ 53,05 para US$ 59,10 por barril. Não é admissível basear a política orçamentária em expectativas desse tipo. Como o governo já havia reduzido a meta do superávit primário - o dinheiro posto de lado para pagamento de juros -, já estava garantido um espaço adicional para a acomodação de gastos crescentes num cenário de crise. Com a arrecadação em queda e a manutenção dos incentivos fiscais, aquele espaço é cada vez mais estreito, mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva prefere assumir o risco de comprometer a saúde fiscal do País. Sua prioridade - já há um bom tempo - é garantir a eleição de seu sucessor, ou, espera ele, de sua sucessora. Não se espere, portanto, nenhuma demonstração de responsabilidade fiscal desse governo. Mas poderá ocorrer uma encenação. O Ministério da Fazenda, segundo informaram fontes de Brasília, pretende retomar as negociações para conseguir a aprovação, neste ano, de um projeto de lei sobre a expansão dos gastos com o funcionalismo. De acordo com o projeto já apresentado pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR), a folha de pagamentos poderá ter um crescimento real de até 2,5% ao ano. O governo apresentará essa proposta como um esforço para limitar a expansão da folha. Na prática, o aumento anual de 2,5% será tomado como um compromisso do governo e o País terá de incluir no calendário esse encargo adicional. De fato, já se fala num limite de 3% e isso é apresentado como boa notícia: entre 2003 e 2005, segundo argumentou um técnico da Fazenda, a média foi de 4,5%. E daí? A ideia de um inchaço contínuo e regulamentado da folha de salários do funcionalismo é uma indecência administrativa e política. Mas o governo não pode produzir nada melhor, quando o presidente só tem um objetivo - ganhar a próxima eleição.