Imagem ex-librisOpinião do Estadão

A inflação baixa e as incertezas

Cenário econômico promissor é insuficiente para sustentar o otimismo de analistas e investidores, quando há dúvidas sobre a aprovação da reforma da Previdência

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

Com inflação bem comportada, como comprovam os números de novembro e a disposição dos consumidores, sobrariam razões, num quadro político mais saudável, para o mercado apostar em novos cortes de juros e em melhores condições para a economia em 2018. Mas o cenário econômico promissor é insuficiente para sustentar o otimismo dos analistas e investidores, quando há dúvidas sérias sobre a aprovação da reforma da Previdência. A incerteza contamina, de forma inevitável, as projeções sobre as finanças públicas ao longo do mandato do próximo presidente. Sem o conserto das contas de governo, a dívida oficial continuará crescendo sem controle e os juros subirão fatalmente, acompanhando o agravamento da crise fiscal e a nova disparada dos preços. Não há terrorismo neste cenário nem sequer novidade para o cidadão razoavelmente informado sobre as condições e perspectivas da economia nacional.

Se o programa de ajustes for travado, um enorme esforço realizado no último ano e meio será provavelmente perdido, com a reversão dos avanços conseguidos até agora. Em novembro ficou em 0,28% a inflação medida pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), produzido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A taxa acumulada no ano, de 2,50%, foi a menor para esse período de 11 meses desde 1998, quando a variação foi de 1,32%. Em 12 meses o indicador subiu 2,80%, pouco mais que no período encerrado em outubro (2,70%).

Para os consumidores de renda mais baixa a evolução dos preços tem sido ainda mais favorável. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) aumentou 0,18% no mês passado e 1,80% no ano, a menor variação acumulada nos meses de janeiro a novembro desde a implantação do Plano Real, em 1994. O INPC é baseado nos gastos de famílias com renda mensal de 1 a 5 salários mínimos. A base do IPCA é o orçamento médio de famílias com ganhos de 1 a 40 salários mínimos por mês. As faixas são medidas em salários, mas a fonte de rendimento pode ser qualquer uma.

A inflação tem sido freada principalmente pelo recuo do custo da alimentação, favorecido pelas excelentes condições de oferta. Em 12 meses, os preços dos alimentos diminuíram em média 2,32%, segundo o relatório do IPCA.

A alimentação é o item de maior peso na composição dos dois índices – e com maior importância no caso do INPC. Mas o recuo da inflação tem sido observado na maior parte dos grupos de bens e serviços consumidos pelas famílias. Em novembro, por exemplo, em sete dos nove grandes grupos incluídos no IPCA houve diminuição de preços ou aumento menor que no mês anterior. Com inflação mais contida, e especialmente com a ajuda dos preços dos alimentos, as famílias têm conseguido aumentar e também diversificar os gastos de consumo.

No terceiro trimestre, quando o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 0,1%, o comércio foi a atividade econômica com melhor desempenho, avançando 1,6% em relação ao trimestre anterior. Comentando esses dados, o chefe da Divisão Econômica da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Fábio Bentes, atribuiu a expansão das vendas a quatro fatores: “Regeneração do mercado de trabalho, inflação baixa, juros em queda e disponibilização de recursos extraordinários para o consumo”.

Os três primeiros fatores estão obviamente interligados. Inflação baixa abre espaço para redução de juros e para o aumento dos gastos, com reflexos benéficos na produção e na criação de empregos. Mais empregos levam a mais consumo e a roda continua girando na direção certa. Mas a confiança na política econômica, especialmente no programa de ajustes e reformas, foi sempre uma referência importante para empresários e investidores.

Três trimestres de crescimento indicam uma firme recuperação. Mas a melhora mal completa um ano e a irresponsabilidade política poderá travar a roda da economia e fazê-la girar na direção errada. Bastará emperrar os ajustes e reformas, multiplicando riscos, incertezas e temores.