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A inflação da omissão

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Por Redação
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Com 6,59% acumulados em 12 meses, a inflação superou o limite da margem de tolerância e ficou quase 2,5 pontos acima da meta oficial, de 4,5%. Isso põe em xeque o Banco Central (BC) e torna muito difícil evitar medidas mais duras na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), nos dias 16 e 17. Na América do Sul, números de inflação piores que os brasileiros só têm aparecido nas economias argentina e venezuelana, desorganizadas por governos populistas, economicamente irresponsáveis e desastradamente intervencionistas. Apesar de ruins, os dados de março, recém-publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram alguns preços com aumentos menores que nos meses anteriores. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, destacou esses detalhes positivos e tentou mostrar algum otimismo. A inflação, segundo ele, está em trajetória de redução. Apesar disso, o ministro prometeu medidas para impedir a propagação da alta de preços. O BC reafirmou em nota a mensagem distribuída pelo Copom depois de sua última reunião, no mês passado. As autoridades monetárias continuarão avaliando a evolução da economia e dos indicadores de preços para decidir os próximos passos. O presidente do BC, Alexandre Tombini, reiterou várias vezes, nas últimas semanas, o compromisso de agir contra uma inflação por ele descrita como preocupante e resistente. Esses adjetivos continuam perfeitamente adequados para descrever a desordem dos preços. Os núcleos de inflação calculados pelos especialistas diminuíram de fevereiro para março, acompanhando a redução do índice cheio, de 0,6% para 0,47%. Vários preços aumentaram mais devagar que nos meses anteriores e o índice de difusão, referente à parcela de itens com preços aumentados, diminuiu de 72,3% para 69%. São dados positivos, sem dúvida, mas é muito cedo para festejar a acomodação das pressões inflacionárias e seria uma irresponsabilidade continuar contemporizando, à espera de uma acomodação espontânea da inflação.As medidas tomadas até agora pelo Executivo podem afetar temporariamente alguns preços, mas nenhuma delas tem efeito anti-inflacionário e são todas ineficientes como estímulos ao investimento produtivo. Nenhuma das providências adotadas ou prometidas até hoje serve para substituir uma política fiscal austera e um corajoso aperto monetário. O aperto necessário será tanto mais duro quanto mais o Copom tentar adiá-lo. Será tanto mais severo, também, quanto mais prolongada for a farra fiscal, com generosa distribuição de benefícios setoriais e nenhum esforço para conter os gastos públicos. Embora os novos números da inflação indiquem certa melhora do quadro, ainda estão longe de apontar um retorno ao equilíbrio. Um indicador de difusão de 69% ainda mostra aumentos muito espalhados e mais uma vez desmente a tese de uma inflação gerada por choques de oferta de alguns produtos. A persistência da inflação dos serviços denuncia uma demanda muito aquecida e os estímulos ao consumo apenas reforçam esse desajuste. Além do mais, uma taxa mensal de inflação de 0,47%, como a de março, é escandalosamente alta. Acumulada em 12 meses, uma alta mensal dessa magnitude resultaria em 5,78%, uma inflação muito superior à da maior parte dos países desenvolvidos e emergentes. Projetada para quatro trimestres, a variação acumulada entre janeiro e março, de 1,94%, produz a assustadora inflação anual de 7,99%. Ninguém pode tolerar taxas de inflação como as brasileiras e ao mesmo tempo reclamar do desajuste cambial. A diferença entre as taxas de inflação de um país e as de outros participantes do mercado - concorrentes, clientes ou fornecedores - é um dos fatores determinantes do câmbio real, como devem ter aprendido os condutores da política econômica brasileira. Finalmente, essas mesmas autoridades deveriam explicar claramente se a meta de inflação é 4,5% ou qualquer valor entre 4,5% e 6,5%. Até agora, o Executivo e o BC têm agido como se a meta incluísse toda a margem de erro ou de tolerância. O resultado tem sido um desastre.