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A inflação das expectativas

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Por Redação
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A expectativa de inflação é um dos fatores determinantes da alta de preços, como sabem os economistas há muito tempo, e também por isso o governo brasileiro deveria estar preocupado com o pessimismo dos consumidores. A inflação esperada pelo público para os próximos 12 meses ficou em 7,5% em novembro - número correspondente à mediana das previsões coletadas na última pesquisa mensal da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Esse valor foi o mesmo encontrado na sondagem de outubro. Em um ano a menor taxa prevista foi 7,1%, em dezembro de 2013. Os resultados obtidos nos outros meses oscilaram entre 7,2% e 7,5%. Ficaram um pouco acima da inflação verificada nas pesquisas mensais do governo e da própria FGV, sempre muito próxima do ritmo anual de 6,5%, limite superior da margem de tolerância fixada para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), usado como referência para a política oficial. Em alguns momentos esse nível foi superado, mas a marca de 7% nunca foi atingida. Não cabe falar em erro dos entrevistados. Eles sempre estiveram certos quanto à persistência de uma alta de preços muito acima da meta de 4,5% e até superior ao teto de tolerância e seu pessimismo, portanto, nunca foi infundado. Mais equipados tecnicamente para projeções, economistas do mercado financeiro têm estimado taxas anuais de inflação também próximas do limite. No dia 14, a mediana das estimativas indicava para este ano 6,40% como número final, de acordo com a pesquisa Focus, do Banco Central (BC). Se o governo tiver muito empenho em criar expectativas mais otimistas, ou menos sombrias, terá de se contentar com as opiniões da presidente Dilma Rousseff e de seus colaboradores, Mas até a mediana apontada na sondagem da FGV, 7,5%, o mesmo número de outubro, dá uma ideia imperfeita de como evoluíram as expectativas dos consumidores. Um exame de outros detalhes indica um viés de alta, como observou o economista Pedro Costa Ferreira, da Fundação. A mediana se manteve, mas aumentou o número de respostas nas faixas a partir de 7%. Nessa faixa, por exemplo, a parcela de respostas passou de 25,7% para 26,2%. Na seguinte, de 16,8% para 17,1%. Na de 10%, a concentração de respostas subiu de 13% para 14%. Resumindo: passou de 69,8% em outubro para 74,9% em novembro o grupo de consumidores com expectativas declaradas de inflação igual ou superior a 7% nos 12 meses seguintes. A nova diretoria do BC, segundo fontes da área econômica do governo, terá como principal tarefa levar a inflação à meta de 4,5% em dois anos. A missão, com esse prazo, aparentemente, já está na agenda há algum tempo. No terceiro trimestre de 2016, segundo a última projeção das autoridades monetárias, a inflação estará em rota de convergência para a meta. Mas nenhuma estimativa oficial indicou, até agora, se o alvo será de fato atingido em dois anos. Além disso, em cada relatório trimestral de inflação o pessoal do BC empurra suas projeções para três meses à frente. Assim, o movimento de convergência em alguma fase de 2016 já foi mencionado várias vezes. Há cinco anos a inflação está oscilando em torno da taxa anual de 6%. Em mais de uma ocasião superou a fronteira de 6,5% em 12 meses. Quando isso ocorre antes de dezembro, alguma autoridade logo repele as críticas com um argumento muito simples: o limite é gregoriano, isto é, só vale para períodos encerrados em 31 de dezembro. Muito menos séria que esse argumento, no entanto, é a própria orientação da política anti-inflacionária. Há muito tempo, segundo analistas muito respeitados, o governo abandonou a meta de 4,5% e escolheu como objetivo uma taxa de inflação entre 5,5% e 6%. Isso nunca foi declarado oficialmente, mas a tese tem sido confirmada pelos resultados anuais e pela condução da política. O Executivo nunca agiu para limitar o efeito inflacionário da gastança. Como complemento, pressionou o BC, mais de uma vez, para afrouxar ou manter frouxa a política de juros. A tolerância à inflação é indisfarçável. A dúvida mais importante, neste momento, é se essa atitude será mantida. O resto é detalhe.