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A Justiça e a Lei da Entrega

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Por Redação
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Em vigor desde o final de 2009, a lei estadual paulista que obriga vendedores e fornecedores a fixar a data e o turno - matutino, vespertino ou noturno - para a entrega de produtos ou realização de serviços representa um avanço significativo, em matéria de direito do consumidor. Ela vale tanto para as lojas físicas quanto para as lojas virtuais, que atuam por meio da internet. Graças à Lei 13.747, mais conhecida como Lei da Entrega, os consumidores não precisam ficar de plantão um dia inteiro à espera dos produtos e serviços que adquiriram. Nos 14 meses de vigência desse texto legal, a Fundação Procon - o órgão encarregado de aplicá-lo no Estado de São Paulo - fiscalizou 374 empresas, autuou 201 estabelecimentos e aplicou multas no valor total de R$ 32 milhões.Durante sua tramitação na Assembleia Legislativa, o projeto da Lei da Entrega sofreu forte resistência de entidades do comércio. A Associação Comercial de São Paulo alegou que, em vez de beneficiar o consumidor, ela o prejudicaria, pois as lojas seriam obrigadas a repassar para o preço final de seus produtos o custo do aumento das frotas de entrega. Pela Lei 13.747, caso o consumidor não receba o produto ou serviço comprado na data e no turno previamente marcado, ele deve procurar o Procon e denunciar a empresa vendedora, que poderá ser multada, com base no Código de Defesa do Consumidor. A legislação deixa a critério dos compradores a escolha - dentre as opções apresentadas pelas empresas - dos dias e horários disponíveis para a entrega de produtos ou prestação de serviços. E aquelas que não cumprirem o que foi acertado ficam sujeitas a multas que variam de R$ 400 a R$ 750 mil. Em casos extremos, a multa pode chegar a R$ 3 milhões. A penalidade máxima é a suspensão do alvará de funcionamento do estabelecimento. A Lei 13.747 também determina que os serviços de entrega devem respeitar as regras e restrições de cada município paulista. No entanto, à medida que as fiscalizações do Procon se tornaram mais rigorosas, o Tribunal de Justiça (TJ) de São Paulo passou a conceder liminares, suspendendo os efeitos da Lei da Entrega até o julgamento de mérito. A primeira liminar foi concedida em janeiro de 2010 a uma rede de eletrodomésticos. Segundo seus advogados, ela não teve tempo hábil para reformular o esquema de entrega de seus produtos. Alegando que as empresas que prometem entrega agendada com o pagamento de taxas têm aparato logístico para cumpri-la, a Procuradoria-Geral do Estado conseguiu cassar a liminar. No entanto, a empresa recorreu e a 3.ª Câmara de Direito Público do TJ suspendeu o pagamento da multa. Essa decisão estimulou lojas de departamento, supermercados, redes varejistas e empresas de comércio eletrônico a contestar judicialmente a Lei da Entrega - e o julgamento de mérito deve demorar anos. Evidentemente, isso prejudica os consumidores e enfraquece a atuação dos órgãos de defesa do consumidor. Afinal, se eles não puderem aplicar multas, as autuações das empresas que desrespeitam a legislação acabarão sendo inócuas. O que está ocorrendo em São Paulo também vem acontecendo nos municípios - como Rio de Janeiro e Belo Horizonte - e Estados - como Mato Grosso do Sul - que têm Leis da Entrega. As empresas - com apoio das associações e federações do comércio - alegam na Justiça que os municípios não têm competência para legislar sobre a matéria. Nos caso dos Estados, as empresas deixaram de lado o argumento jurídico, atribuindo às chuvas, enchentes, congestionamentos e até ao rodízio de veículos a culpa pelo não cumprimento das entregas previamente agendadas. Em alguns Estados, é grande o número de liminares concedidas às empresas. Em outros, os Tribunais de Justiça têm sido mais comedidos. Independentemente da decisão de mérito que o Judiciário vier a tomar nessa polêmica entre empresas e Procuradorias estaduais e Procons, a Lei da Entrega dá a medida da maturidade do mercado consumidor brasileiro.