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A lei agrícola dos EUA e o Brasil

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Por Redação
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A nova lei agrícola americana impõe dois grandes problemas ao governo brasileiro, um imediato, outro de médio ou longo prazo. O primeiro é relacionado ao contencioso do algodão, uma disputa legal decidida em julgamento na Organização Mundial do Comércio (OMC). O segundo entrará em pauta quando for retomada para valer a Rodada Doha de negociações comerciais, praticamente ressuscitada em dezembro na conferência ministerial de Bali, na Indonésia. Em resposta à questão imediata, há alguns dias o ministro de Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, prometeu examinar detalhadamente a nova legislação, para decidir se vale a pena adotar uma retaliação comercial como sequência do caso do algodão. É preciso saber como o texto recém-aprovado afetará os produtores no Brasil, fortemente prejudicados, no regime anterior, pelos subsídios aos produtores e exportadores americanos. A OMC condenou há alguns anos a política seguida nos Estados Unidos. Como as autoridades americanas mantiveram o sistema, o governo brasileiro foi autorizado em 2009 a aplicar retaliações no valor de US$ 830 milhões. Em seguida, os negociadores encontraram uma solução melhor para as duas partes. Os americanos pagariam aos produtores brasileiros US$ 147 milhões por ano e adotariam uma legislação de acordo com as normas internacionais. Mas os pagamentos foram suspensos em outubro do ano passado e com isso se reabriu a possibilidade de retaliação. O governo brasileiro ainda examina essa possibilidade e provavelmente levará em conta, ao decidir, a legislação recém-aprovada e dependente, na quarta-feira, da assinatura do presidente Barack Obama. Não havia dúvida, no entanto, sobre a sanção presidencial, porque a Lei Agrícola de 2014 resultou de um trabalho bipartidário. À primeira vista, o novo sistema deve produzir menos distorções que o regime anterior. Os pagamentos diretos aos produtores, concedidos com ou sem necessidade, serão substituídos por um mecanismo de proteção contra oscilações do mercado e de seguro contra desastres, como secas. O mecanismo de seguro contra desastres já foi testado com resultado positivo na seca de 2012. Falta saber se o novo esquema de garantia contra instabilidade de preços produzirá distorções na produção e na oferta e, portanto, se prejudicará os plantadores de outros países. A nova legislação consolida e simplifica várias linhas de ação e, segundo seus defensores, contribuirá para a redução de custos orçamentários e para a diminuição do déficit fiscal americano. O segundo problema, de maior alcance, tem relação com os planos de reforma e de liberalização do comércio multilateral. Americanos e europeus haviam assumido nas discussões da Rodada Doha o compromisso de eliminar até 2013 subsídios a exportações agrícolas. Esse compromisso foi uma das primeiras e mais importantes conquistas dos países em desenvolvimento nos primeiros anos da rodada. Mas as negociações emperraram e foram paralisadas em 2008. Nos anos seguintes, governantes falaram várias vezes em retomar as conversações, mas a crise impossibilitou qualquer iniciativa séria até o ano passado. No segundo semestre de 2013 o novo diretor-geral da OMC, o brasileiro Roberto Azevêdo, conseguiu mobilizar a diplomacia dos países com maior peso comercial para um acordo sobre a reativação da Rodada. A conferência de Bali produziu um resultado positivo e as negociações estão de novo na agenda. Mas falta saber de onde partirão as conversações. Os governos da União Europeia definiram no ano passado um novo roteiro para a política agrícola comum. Os subsídios agrícolas serão reduzidos, mas ainda serão a maior parcela do orçamento comunitário até 2020. Nos Estados Unidos, uma nova Lei Agrícola, com vigência até 2018, acaba de ser aprovada. Os negociadores terão de enfrentar essas novidades como fatos consumados e dificilmente alteráveis, quando voltarem a discutir para valer as novas regras multilaterais de comércio. As condições do comércio agrícola, tudo indica, estão dadas até 2018 ou, mais provavelmente, pelo menos até 2020.