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A luta de classes de Haddad

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Por Redação
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O prefeito Fernando Haddad está colhendo o que plantou no caso do aumento exorbitante do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), mas, em vez de reconhecer os erros que cometeu - seria demais esperar que o fizesse -, preferiu partir para o ataque. E ainda assim escolhendo o pior caminho possível. Alega ele que as derrotas do aumento na Justiça - à qual recorreram alguns dos que se julgaram prejudicados por ele - é consequência da luta de classes, vencida pelos ricos, que com isso vão pagar menos, e perdida pelos pobres, que teriam redução ou isenção do tributo.Como o argumento é tosco, primário, Haddad achou por bem dar-lhe uma tintura sociológica, apelando para o título do clássico de Gilberto Freyre sobre a formação do Brasil - Casa Grande e Senzala. Logo depois da decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, que manteve liminar do Tribunal de Justiça de São Paulo que suspendeu o aumento do IPTU, o prefeito fez dura crítica ao presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, um dos autores da ação, identificado com a elite, com a "Casa Grande"."A 'Casa Grande' não deixa a desigualdade ser reduzida na cidade. Em 2014, manteremos o quadro atual. Infelizmente, não conseguimos transferir renda dos mais ricos para os mais pobres", afirmou Haddad. Ele desistiu do aumento pretendido - de até 20% para os imóveis residenciais e de até 35% para os comerciais -, embora a decisão da Justiça não seja definitiva, e o reajuste do IPTU será pela inflação de 2013, estimada em 5,6%. Pior do que o ridículo dessa comparação, que tem tudo de demagogia e nada de verdade, é a irresponsabilidade de atiçar e manejar o ódio de classe como método de governo.Como se isso não bastasse, e tomado de estudada fúria, o prefeito foi desenterrar o fim da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), apoiado pela Fiesp, e que "tirou R$ 60 bilhões da saúde", para fazer uma comparação com o IPTU. Segundo Haddad, "a Fiesp está tentando fazer agora a mesma coisa com a cidade de São Paulo". Ora, é mais do que sabido que, em vez de ajudar a saúde, finalidade para a qual foi criada, a CPMF servia mesmo era para engordar o caixa geral do governo. Para a saúde sobrava pouco. Além do que, se foi extinta, isso não se deve apenas aos que tinham todo o direito de ser contra ela - um imposto de má qualidade -, mas principalmente por culpa do próprio governo, que tem folgada maioria no Congresso.Quanto à decisão do ministro Barbosa, que levou o prefeito a desistir do aumento e partir para a fanfarronada da luta de classes, ela prima pela sensatez. Argumentou Barbosa que o contribuinte seria prejudicado se o imposto fosse cobrado com aquele aumento e futuramente o Tribunal de Justiça, no julgamento do mérito, considerasse o reajuste ilegal. De acordo com ele, "uma vez recolhido o valor do tributo, sua restituição é demorada e custosa, no melhor dos mundos possíveis, consideradas as vicissitudes bastante conhecidas do precatório".O principal erro do prefeito, que acabou conduzindo a esse resultado, foi ter ir ido com muita sede ao pote do IPTU. Ninguém se opõe a uma revisão periódica da Planta Genérica de Valores (PGV), base de cálculo para o IPTU. Principalmente tendo em vista que a última revisão foi feita em 2009. Haddad se perdeu pela gula. A primeira versão de seu projeto previa aumento de até 35% para os imóveis residenciais e de até 45% para os comerciais, valores que foram reduzidos para, respectivamente, 20% e 35%, como consequência da forte reação negativa à proposta, mas que mesmo assim continuaram altos demais. Como se isso não bastasse, os que o contestam alegam também que houve irregularidades na tramitação do projeto. Uma das razões que levaram o prefeito a exagerar na dose foi a necessidade de recursos para cobrir o aumento do subsídio aos ônibus que, com o congelamento da tarifa em R$ 3, como resultado das manifestações de junho, chegou a R$ 1,6 bilhão. Se Haddad não misturasse coisas que não devem ser misturadas, e propusesse um aumento razoável, com base na revisão da PGV, não teria perdido tudo.