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A missão de Jobim

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Por Redação
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Há meses o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vinha procurando um substituto para o ministro da Defesa, Waldir Pires. Diante da crise do sistema aeroportuário, que começou com o choque de dois aviões sobre Mato Grosso e culminou com a tragédia de Congonhas, o ministro parecia estar em estado catatônico. E quando saia do torpor, era para dizer que não era gerente do transporte aéreo brasileiro ou para reclamar do baixo salário. Logo no início da crise, constatada a incapacidade do ministro Waldir Pires para lidar com uma situação complicada pela insubordinação dos sargentos controladores de vôo, o presidente Lula não o demitiu porque sabe escolher auxiliares ineptos para a função, mas não sabe como demiti-los. Depois, visto ser impossível convencer Pires a renunciar ao cargo - apesar dos conselhos para que se demitisse e das humilhações a que foi submetido -, o presidente Lula se rendeu às evidências e passou a buscar um substituto. Todas as sondagens e convites que fez - ou foram feitos em seu nome - foram frustrados. Ninguém queria aceitar o espinhoso cargo, nas atuais circunstâncias. Só quando foi convidado pela terceira vez, o ex-ministro Nelson Jobim aceitou o cargo. Sabe-se lá o que o fez mudar de idéia. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva queria tê-lo no gabinete ministerial desde o início do segundo mandato. Havia separado para ele a Pasta da Justiça. Mas as circunstâncias em que Jobim encerrou sua carreira de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e a frustração de seus projetos políticos foram fatores decisivos para que o ex-presidente do STF voltasse à sua banca de advocacia. Assume o Ministério da Defesa com a incumbência de gerenciar e supervisionar o pacote de medidas de emergência que foi anunciado na semana passada pelo Conselho Nacional de Aviação Civil (Conac), ou seja, como síndico da crise aeroportuária. Mas o apagão dos aeroportos é a ponta do iceberg da verdadeira crise que engolfa o Ministério da Defesa. Na curta e acidentada história desse Ministério, nem um de seus titulares deixou ou assumiu o cargo a não ser na crista de alguma crise. Acreditava-se, quando o Ministério foi criado, que os militares resistiriam à nova organização da Defesa, principalmente porque não se conformariam com a perda de status político, já que as três Forças perderiam a condição de Ministérios e passariam a ser Comandos subordinados a um ministro civil. Mas foram escolhas inadequadas que determinaram o pobre desempenho da Pasta, e não a resistência dos militares - que nunca houve. O Ministério da Defesa foi criado para desempenhar duas funções básicas. Uma, a de tornar operacional o princípio democrático da subordinação do poder militar ao poder político. Nesse sentido, foi de fato um importante instrumento de consolidação da democracia. A outra função é a de conduzir três Forças que atendem a interesses profissionais que freqüentemente só se harmonizam e integram por arbitramento. Na tarefa de colocar essas três Forças a serviço de uma única política, em ambiente de coordenação e integração de meios e esforços, o Ministério da Defesa não teve tanto sucesso. E isso ocorreu porque os ministros que ocuparam a Pasta não fizeram as reformas institucionais necessárias, ou porque não sabiam como fazê-lo ou porque não tinham apetite para a função. E não receberam cobrança alguma do presidente da República. O caos aéreo é, a rigor, a conseqüência desse estado de coisas. Todos os órgãos que cuidam da estrutura aeroportuária e da segurança do tráfego aéreo estão subordinados ao Ministério da Defesa. É ele o órgão incumbido de coordenar o sistema de aviação civil, supervisionando a Anac, a Infraero e o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea), que cuida da segurança de vôo. A ele se subordina o Comando da Aeronáutica. É o Ministério o responsável, em última análise, pela situação que levou à cooptação da Anac pelas empresas aéreas, pelos gastos da Infraero com estações de passageiros e não com pistas de pouso e pela transformação, no prazo de menos de um ano, de um sistema de navegação aérea que figurava entre os mais seguros do mundo num risco constante para os passageiros. A missão do ministro Jobim, portanto, não é apenas a de superar a crise dos aeroportos. O desafio que está à sua frente é o de fazer o Ministério da Defesa justificar a sua existência. O tempo dirá se está à altura da missão.