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A pretensão salarial dos juízes

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Por Redação
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Reclamando da falta de "boa vontade" do Executivo e do Legislativo para repor perdas inflacionárias nos salários da magistratura, os juízes federais no Rio Grande do Sul impetraram um recurso no STF pedindo um reajuste de 30%. A iniciativa tem o apoio de 300 juízes federais de São Paulo e Mato Grosso. Eles alegam que estão sem aumento desde 2006 e que a pretensão é garantida pela Constituição. "A insatisfação é grande. Não estamos pedindo aumento salarial, mas exclusivamente reposição", diz Gabriel Wedy, presidente da Associação dos Juízes Federais do Rio Grande do Sul. "Decidimos ir ao STF porque há um flagrante descumprimento da Constituição e uma evidente má vontade do Congresso em votar projetos de interesse do Judiciário", afirma ele, depois de lembrar que o "desgaste" na relação entre o Legislativo e a Justiça decorreria de determinadas iniciativas da magistratura, como a campanha contra o direito dos parlamentares a foro privilegiado. "Para nós, são campanhas legítimas, de interesse do cidadão brasileiro, mas que causaram melindre", diz Wedy. Em retaliação, o Congresso estaria atrasando a votação do projeto de criação de 230 varas federais e da Proposta de Emenda Constitucional que adota o sistema de adicionais por tempo de serviço. "O fato concreto é que, a par dessas questões, a Constituição tem de ser respeitada. Não existe categoria do funcionalismo no País que não tem reposição das perdas da inflação há quase cinco anos." Embora Wedy insista em que a Constituição assegura aos servidores públicos o direito ao "reajuste" salarial, o que ela faz, no inciso X do artigo 37, é apenas assegurar uma "revisão geral anual de vencimentos" - e reajuste e revisão não são sinônimos. Como é sabido, o reajuste fica a juízo dos responsáveis pela gestão das finanças públicas. Por acaso, a iniciativa dos juízes federais ocorreu na mesma semana em que o ministro da Fazenda reconheceu que o País está em recessão. Nos últimos meses, economistas das mais diversas tendências afirmaram que a elevação dos gastos correntes do governo, especialmente com folha de pagamento, combinada com a queda na receita fiscal registrada desde o início do ano, pode desequilibrar as finanças públicas. Recentemente, além disso, um estudo do Ministério do Planejamento mostrou que, em oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso e em seis anos de governo Lula, reajustes retroativos e planos de reestruturação de carreira aumentaram a folha de pagamento do Judiciário em 295%, em valores reais. No mesmo período, o Executivo elevou suas despesas com pessoal em 72%. Em número de servidores, o Executivo registrou um aumento de 17%, nos últimos 14 anos, ante 79% no Judiciário. Os juízes alegam que parte do aumento de gastos da Justiça Federal com pessoal se deve à criação de juizados especiais federais e à instalação de turmas recursais, para atender à crescente demanda de serviços judiciais. Também afirmam que, apesar da elevação de custos, a instituição teria propiciado um aumento de arrecadação, por meio das varas de execuções fiscais. "O Judiciário arrecada muito mais do que gasta", diz Wedy. O problema, contudo, é que os vencimentos da Justiça são muito mais altos do que os do Executivo e a eventual concessão de um reajuste aos juízes federais agravaria o descompasso salarial entre os Poderes, estimulando com isso uma corrida salarial de todo o funcionalismo público, em nome do "direito à isonomia". Estudos do Ministério do Planejamento mostram que a média salarial do Judiciário é, hoje, superior ao triplo da média do Executivo. Em sua defesa, os juízes federais gaúchos alegam que o Judiciário é um Poder independente. Os Poderes, de fato, são independentes, mas o cofre é um só e a responsabilidade sobre o que sai e entra é do Executivo. É por isso que a pretensão dos juízes gaúchos não se sustenta. Além de vir na hora errada, num momento de queda de receita fiscal, e com base numa interpretação enviesada da Constituição, ela só poderia ser examinada depois de uma reforma radical nas carreiras públicas - e, aí, os primeiros a serem beneficiados não seriam os membros do Judiciário, mas os mal remunerados servidores do Executivo.