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A recuperação e os impostos

Há motivos fortes para lamentar os bilhões perdidos em consequência da deformação, no Congresso, da proposta de renegociação das dívidas tributárias formulada pelo Executivo

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Por Redação
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A reativação dos negócios e a criação de empregos continuam reforçando a arrecadação federal, mas o governo ainda terá de ser muito cuidadoso para manter suas contas dentro dos limites fixados para 2017. Se as projeções mais otimistas se confirmarem, será possível fechar o ano com um déficit pouco inferior a R$ 159 bilhões no balanço primário, calculado sem a conta de juros. Para entender mais claramente como a reação econômica afetou os impostos e contribuições, é preciso descontar os fatores atípicos, como a arrecadação proporcionada pelos programas de parcelamento de débitos tributários e de regularização de recursos no exterior. Esses fatores produziram efeitos bem distintos em 2016 e em 2017. Descontados esses componentes, o governo central arrecadou R$ 107,03 bilhões no mês passado, 4,20% mais que em outubro de 2016 em valores atualizados. Pelo mesmo critério, a arrecadação de janeiro a outubro atingiu R$ 1 trilhão, com ganho real de 1,46% em relação à soma recolhida no período correspondente do ano passado.

Sem o desconto dos fatores atípicos, a comparação mostra um desempenho pior neste ano do que em 2016. Somados todos os componentes, a arrecadação de outubro, de R$ 114,91 bilhões, foi 23,56% menor que a de um ano antes. A acumulada em dez meses, de R$ 1,07 trilhão, ficou 1,87% abaixo da contabilizada nesse período no ano anterior. Visto desse ângulo, o cenário é bem menos claro e os efeitos fiscais de três trimestres de recuperação da economia ficam embaçados.

Para o cumprimento da meta fiscal, no entanto, é preciso contar cada real arrecadado. Há, por isso, motivos fortes para lamentar os bilhões perdidos em consequência da deformação, no Congresso, da proposta de renegociação das dívidas tributárias formulada pelo Executivo. Ao destroçar a proposta para favorecer empresas devedoras e atender, também, a interesses financeiros pessoais, parlamentares diminuíram perigosamente a parcela de pagamento inicialmente prevista para este exercício.

O quadro mais amplo da arrecadação, sem desconto dos fatores atípicos, mostra, ao lado de perdas importantes na comparação entre os números de 2017 e 2016, ganhos consideráveis em vários tributos e contribuições. Exemplos: o Imposto de Renda sobre salários, o PIS-Pasep/Cofins, a Contribuição Previdenciária e o Imposto sobre Produtos Industrializados (sem a parte sobre importações) proporcionaram neste ano receitas maiores que as de janeiro a outubro de 2016. Esses ganhos foram propiciados, segundo a análise divulgada pela Secretaria da Receita Federal, pela melhora de vários indicadores de atividade. A relação inclui os aumentos da produção da indústria, das vendas do comércio varejista, da massa de salários e do valor em dólar das importações.

Segundo a tabela, entre dezembro de 2016 e setembro de 2017, a massa de salários foi 2,50% maior que a de um ano antes, descontada a inflação. Isso se explica tanto pelo aumento de preços bem mais moderado que no período anterior como pela criação de empregos formais, sensível neste ano. Embora em queda, o desemprego geral permanece muito alto, na vizinhança de 13% da força de trabalho, apesar do avanço das contratações com carteira assinada.

A criação de empregos explica também o aumento da receita previdenciária, de R$ 320,70 bilhões de janeiro a outubro, com ganho real de 1,24% em relação aos dez meses correspondentes do ano anterior. Apesar da arrecadação melhor, a Previdência deve ter continuado amplamente deficitária. O aumento do déficit será conhecido nos próximos dias, quando o Tesouro divulgar a atualização do balanço de receitas e despesas do governo central.

Esse balanço confirmará mais uma vez o enorme desajuste da Previdência e, portanto, a urgência da reforma. Esse desajuste deverá aumentar com a mudança continuada na proporção entre contribuintes e beneficiários. Sem correção, volumes crescentes de recursos públicos irão pelo ralo das aposentadorias e pensões, desviados de outras destinações de importância crucial.