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A resistência dos servidores

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Por Redação
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O acordo a que a base governista que se manteve fiel ao governo - pois uma parte dela estava disposta a não seguir as orientações do Planalto - teve de recorrer para evitar a derrota na primeira comissão técnica da Câmara que examina o projeto de criação da previdência complementar do servidor mostra como continua difícil mudar o regime de aposentadorias do setor público. A derrota nessa votação retardaria ainda mais a mudança.Prevista na reforma previdenciária aprovada em 2003, a criação da Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp) foi proposta pelo governo em 2007, mas o projeto ficou parado na Câmara. Recentemente, a presidente Dilma Rousseff instruiu o ministro da Previdência a negociar com a base governista o exame do projeto, pois a instituição do novo regime previdenciário para o setor público federal é considerada essencial para o ajuste fiscal de longo prazo.Os números não deixam dúvidas quanto à necessidade de uma efetiva reforma do regime previdenciário do servidor federal. O déficit do regime dos funcionários da União é bem maior do que o do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que atende todos os trabalhadores do setor privado, e cresce ao ritmo de 10% ao ano. Em 2010, de acordo com dados do Ministério da Previdência, o déficit do regime próprio, que beneficia 950 mil servidores aposentados, alcançou R$ 51,2 bilhões, enquanto o do RGPS, que beneficia 28 milhões de aposentados, foi de R$ 42,9 bilhões. Ou seja, cada funcionário aposentado custa R$ 53.895 por ano para o contribuinte - pois o déficit é coberto pelo Tesouro -, enquanto o do regime geral custa R$ 1.532.O objetivo da reforma é estabelecer um mínimo de equidade entre os servidores públicos e os trabalhadores do setor privado. O valor dos proventos de aposentadoria e pensões do servidor será limitado ao máximo dos benefícios pagos pelo RGPS, hoje de R$ 3.689,66. Para obter valor superior a esse, o servidor deverá aderir à Funpresp, um sistema de previdência complementar baseado no regime de contribuição definida, como o que existe para o setor privado.Um dos pontos que causavam grande discussão era a instituição de regimes especiais para diferentes carreiras, como a de magistrado. O projeto do governo estende o novo regime a todos os servidores federais civis, titulares de cargos efetivos da União, autarquias e fundações, inclusive membros do Poder Judiciário, do Ministério Público e do TCU.Para não ferir direitos adquiridos, o projeto em exame no Congresso estabelece que as novas regras vigorarão obrigatoriamente apenas para os servidores que ingressarem no serviço público após a vigência da nova lei. Os que estiverem desempenhando suas funções poderão, voluntariamente, se transferir do regime atual para o novo.Essas regras foram mantidas pelo relator do projeto na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara, deputado Silvio Costa (PTB-PE). Certo de que o interesse do governo no projeto seria respaldado pelos deputados da base governista da Comissão, o relator chegou a ler seu relatório na sessão de quarta-feira passada. Mas, num ambiente tumultuado pela grande presença de servidores e pelo interesse de alguns deputados em agradar à plateia, o relator, que também é presidente da Comissão, acertou com as lideranças governistas o adiamento da votação.Costa estimava que, se o texto fosse votado, teria 13 votos a favor e 13 contra. "Nós corríamos o risco de perder, e quando digo "nós" é o País", disse, depois de acertado o adiamento da votação. "O Brasil ia perder, por conta de alguns demagogos que fazem o jogo do corporativismo."Enquanto o proclamado interesse do governo no projeto de criação da previdência complementar dos servidores se mantiver apenas no terreno da retórica, sem resultados práticos na sua tramitação no Congresso, o tema certamente continuará a alimentar a demagogia dos que estão preocupados apenas com votos, não com o País.