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A retração e o rombo externo

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Por Redação
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O Brasil vai de mal a pior e um dos efeitos da crise é um buraco menor nas contas externas. Com desemprego em alta, inflação disparada e dinheiro mais curto, os brasileiros cortam gastos e o País importa muito menos que nos últimos anos. O dólar mais caro poderia favorecer as exportações, barateando os produtos vendidos ao exterior, mas por enquanto sua principal contribuição é outra: as despesas com viagens ao exterior também têm diminuído. Não há, portanto, grande motivo para festejar os sinais de melhora no balanço de pagamentos. De abril para maio, o déficit em conta corrente encolheu de US$ 6,9 bilhões para US$ 3,36 bilhões, numa evolução mais favorável que a prevista pelos economistas do Banco Central (BC), responsáveis pela apuração geral das contas externas. O rombo acumulado no ano ficou em US$ 35,83 bilhões, bem menor que o dos primeiros cinco meses de 2014 (US$ 44,95 bilhões). O déficit em 12 meses caiu de US$ 104,83 bilhões no fim do ano para US$ 95,72 bilhões no mês passado. Isso corresponde a 4,39% do Produto Interno Bruto (PIB), uma proporção ainda alta. O quadro fica um pouco menos feio quando se observa como foi financiado o déficit no mês passado. O investimento direto do País – destinado basicamente a empresas – chegou a US$ 6,6 bilhões e foi mais que suficiente para cobrir o buraco. Em cinco meses, no entanto, ficou em US$ 25,52 bilhões, bem abaixo do desejável. O resto do déficit foi coberto com outros tipos de capital, mais instáveis e em boa parte especulativos. A conta de transações correntes inclui o comércio de bens (balança comercial), o intercâmbio de serviços (como viagens, transportes e aluguel de equipamentos) e o movimento de duas categorias de rendas. A primeira compreende juros, dividendos e salários. A segunda, as transferências unilaterais, formadas em boa parte por remessas de trabalhadores. Numa definição simplificada, a conta corrente engloba e resume, portanto, o intercâmbio de bens, serviços e rendas com o exterior. A outra grande seção do balanço de pagamentos inclui as contas de capitais e de operações financeiras. Para todo o ano, o BC projeta US$ 80 bilhões de investimento direto, uma soma quase suficiente para financiar o déficit estimado para a conta corrente, de US$ 81 bilhões. Até o mês anterior, estimava-se um rombo de US$ 84 bilhões. Se confirmado, será um resultado bem mais favorável que o do ano passado, de US$ 100,84 bilhões. Mas a redução do buraco ainda resultará, como tem resultado até agora, principalmente das más condições da economia brasileira – baixo nível de atividade, maior desocupação, menor poder de compra dos consumidores e menor procura de bens estrangeiros. Os economistas do BC continuam projetando um superávit comercial de US$ 3 bilhões. Será um avanço considerável em relação ao resultado de 2014, um déficit de US$ 6,25 bilhões. Mas o saldo positivo será alcançado, segundo as estimativas, com um movimento comercial muito menor que o de um ano antes: as exportações, previstas em US$ 200 bilhões, serão 10,95% inferiores às de 2014. As importações, de US$ 197 bilhões, serão 14,68% inferiores. A corrente de comércio – exportações mais importações – terá encolhido em um ano 12,84%. A menor receita comercial será em parte explicável pela depreciação dos produtos básicos, mas a causa mais importante ainda será o baixo poder de competição da maior parte da indústria. O saldo de serviços também será melhor, com redução do déficit de US$ 48,46 bilhões para US$ 44,2 bilhões. Boa parte da mudança resultará de um menor déficit em viagens (de US$ 18,72 bilhões para US$ 14,5 bilhões). O dólar mais caro já tem desestimulado o turismo e deverá continuar desestimulando, segundo as estimativas do BC. Retração econômica normalmente reduz o desajuste das contas externas. Esse efeito está ocorrendo, embora as contas continuem ruins. Mas atividade mais lenta é em geral acompanhada também de outro efeito positivo – inflação menor. Desse efeito ainda nem há sinal.