
14 de agosto de 2015 | 03h00
A disputa de domingo passado é chamada de Paso (Primárias Abertas Simultâneas Obrigatórias). É uma votação na qual os eleitores argentinos escolhem os candidatos das coligações que disputarão as eleições presidenciais e legislativas. Servem como uma espécie de termômetro para saber quais são os reais favoritos e para medir a possibilidade de a disputa à Presidência ser decidida já no primeiro turno.
Governador da Província de Buenos Aires, Scioli é o candidato único da Frente para a Vitória, a ala kirchnerista do peronismo, fundada em 2003 para lançar Néstor Kirchner à Presidência. É o favorito da disputa presidencial, segundo as pesquisas. Conforme indicam as primárias, seu principal adversário será Mauricio Macri, prefeito de Buenos Aires, o mais votado na coligação opositora Mudemos, com 24,3%. No total, os candidatos de sua aliança obtiveram 30,1%.
Além de contar com os votos dados a seus companheiros de coligação, Macri espera unir forças com o terceiro colocado nas primárias, Sergio Massa. Ex-kirchnerista e ex-ministro de Cristina, Massa lidera a aliança opositora de centro-direita Unidos por uma Nova Alternativa, que obteve 20,6% dos votos. As negociações entre ambos já começaram, mas enfrentam resistências dentro da coligação de Macri.
Seja como for, os números saídos das prévias indicam que são consideráveis as chances de haver segundo turno na disputa presidencial. Segundo os analistas argentinos, Scioli apareceria como favorito para vencer a disputa já no primeiro turno se alcançasse ao menos 45% dos votos nas primárias, o que ficou longe de acontecer. Ele ficou abaixo de 40% mesmo no distrito de Buenos Aires.
O desempenho do governista aparentemente foi perturbado não apenas pela grave crise no país, mas também por uma denúncia, feita no início deste mês, que ligou o chefe de Gabinete de Cristina, Aníbal Fernández, ao narcotráfico. Scioli teve de sair publicamente em defesa de Fernández. O desgaste do kirchnerismo tornou-se numericamente evidente: Scioli não conseguiu nem 40% dos votos, desempenho muito inferior ao de Cristina nas prévias presidenciais de 2011, quando ela obteve mais de 50%.
Essa queda poderia ter sido maior, não fosse o escandaloso clientelismo praticado pelo governo de Cristina. E nada faz supor que, seja quem for o vencedor na provável disputa entre Scioli e Macri, tal política será inteiramente abandonada em nome da racionalidade econômica. Ao longo da campanha para as prévias, nenhum dos dois se mostrou disposto a comprar essa briga. Macri, aliás, passou os últimos dias a jurar que não eliminaria benefícios sociais e a defender os subsídios para os mais pobres.
Portanto, seja no governo ou na oposição, os mais fortes candidatos se comprometeram a manter, de uma forma ou de outra, o assistencialismo e o estatismo que condenam à pobreza uma parte significativa da população argentina – e não se sabe nem quantos são os pobres, pois não é possível confiar nas maquiadas estatísticas oficiais do governo.
A julgar pelas prévias da disputa presidencial, a Argentina parece enredada no kirchnerismo, mesmo que não haja mais o nome de um Kirchner na cédula de votação.
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