Imagem ex-librisOpinião do Estadão

A Venezuela e o Mercosul

Convulsão política agravou-se recentemente com a abertura do julgamento político do presidente Nicolás Maduro pela Assembleia Nacional

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

A convulsão política, econômica e social por que passa a Venezuela, efeito mais evidente do desastre bolivariano, agravou-se recentemente com a abertura do julgamento político do presidente Nicolás Maduro pela Assembleia Nacional. O Tribunal Supremo de Justiça, composto por maioria chavista, declarou a nulidade da decisão do Legislativo, tumultuando ainda mais as frágeis relações institucionais naquele país.

Em visita ao Vaticano, Maduro pediu ao Papa Francisco que atuasse como mediador de um acordo que pudesse pôr fim à crise. Evidentemente, tratava-se de mais uma dissimulação do presidente para tentar enfraquecer a oposição, que acabou dividida entre os que eram favoráveis à negociação com o governo e os que acreditavam tratar-se apenas de mais um jogo de cena. Em oportunidades anteriores, Maduro já havia demonstrado não ter intenção alguma de dialogar com a oposição, sustentando-se no cargo pela repressão violenta aos movimentos que pedem sua saída, por prisões arbitrárias de lideranças oposicionistas, afrontas à liberdade de imprensa e controle de estruturas de Estado que lhe garantem o tipo de legitimidade que só existe nos delírios de poder dos ditadores.

O afluxo cada vez maior de imigrantes na fronteira inseriu o Brasil na crise e impôs o envolvimento do governo Temer na busca por uma saída que resguardasse, enfim, os interesses do País. O apoio incondicional à Venezuela, que levou o ex-presidente Lula ao desplante de declarar haver “excesso de democracia” naquele país, é uma das marcas mais indeléveis da equivocada política externa brasileira durante os 13 anos de lulopetismo.

Marco dessa catarata ideológica da chancelaria brasileira durante os governos Lula e Dilma Rousseff foi a entrada da Venezuela no Mercosul. Efetivada em 2012, sob as bênçãos de três dos quatro sócios originais – apenas o Paraguai se posicionou contra –, a inclusão do país representou uma clara violação da mais básica condição de aceite no bloco: a vigência plena e inquestionável de um governo democrático. Se não há nação que prospere sem liberdade, isso não haveria de acontecer num bloco cujos membros tolerem arbitrariedades por conveniências de ocasião.

A reacreditação do Mercosul passa, necessariamente, pela decisão acerca da permanência da Venezuela no grupo. Há dois meses, aquele país foi advertido formalmente pelos demais sócios e instado a declarar se aceitava ou não as condições que nortearam a fundação do bloco, entre elas a plenitude do exercício da democracia. As quatro chancelarias fundadoras elaboraram um documento conjunto listando os acordos e normas do Mercosul sobre os quais a Venezuela deveria se manifestar formalmente, entre eles o Protocolo de Assunção sobre Compromisso com a Promoção e Proteção dos Direitos Humanos, de 2005. Diante do silêncio do governo Maduro, não restou alternativa aos demais países-membros a não ser dar prosseguimento ao processo de suspensão da Venezuela do grupo. O grupo notificou formalmente o governo venezuelano sobre a suspensão do país no dia primeiro de dezembro. Com a medida, que Nicolás Maduro ameaçou desrespeitar, chega ao fim a presidência colegiada do Mercosul, que será entregue à Argentina em meados de dezembro.

Entre os vários desafios postos diante do presidente Michel Temer ao assumir a Presidência da República, o resgate do Mercosul é um dos mais prementes no âmbito da política internacional. O fortalecimento das relações regionais com países que comungam dos valores do Estado Democrático de Direito ganha especial importância diante das incertezas econômicas advindas da eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos. O Mercosul ganhará relevância ao ser refundado por seus quatro países signatários. É preciso recuperar os desígnios que inspiraram sua criação e empreender a integração dos mercados regionais agora livres do ranço petista-kirschnerista que pautou o bloco até agora, impedindo seu desenvolvimento como importante organização de comércio global