27 de abril de 2010 | 00h00
Logo após sua criação, em maio de 2007, como parte de um projeto mais amplo de reforma administrativa da Câmara Municipal de São Paulo ? que, na época, ficou conhecido como o "trem da alegria", pois criou quase duas centenas de cargos, dos quais 27 em comissão (ou seja, para serem preenchidos sem concurso), e elevou os vencimentos de algumas categorias de nível superior ?, essa verba podia ser livremente utilizada pelos gabinetes dos vereadores. Só alguns meses depois passou a ser exigida a comprovação de sua utilização mediante a apresentação de notas fiscais.
Na época, a exigência resultou na redução dos gastos de custeio dos vereadores. Mas a reportagem do Estado deixa claro que, com o correr do tempo, a exigência de comprovação não foi suficiente para coibir o uso irregular do dinheiro.
Entre as notas fiscais que comprovariam a utilização da verba de gabinete, há algumas emitidas por empresas que só existem no papel, pois não têm sede, telefone, endereço eletrônico ou referência fora dos relatórios da Câmara Municipal de São Paulo ? que só em abril do ano passado, quase dois anos depois da aprovação da lei, passou a divulgar o destino dado pelos vereadores à verba de gabinete.
Das pessoas jurídicas relacionadas pela Câmara como tendo sido beneficiadas com pagamentos feitos com recursos da verba de gabinete, a reportagem do jornal visitou aleatoriamente mais de uma dezena delas. Uma dessas empresas recebeu mais de R$ 33 mil por serviços prestados ao relator da CPI da Pedofilia, Carlos Alberto Bezerra Júnior, líder do PSDB ? que considerou esses trabalhos "fundamentais na elaboração do relatório final" da comissão ?, mas no endereço informado funciona uma empresa prestadora de serviços de limpeza.
A liderança do PT requisitou R$ 133,2 mil para pagamento de serviços como diagramação de boletins eletrônicos e elaboração de pareceres técnicos durante o recesso da Câmara. Um dos serviços pagos entre abril de 2009 e fevereiro de 2010 foi o da elaboração da página da liderança do partido na internet, mas o site só foi ativado em 9 de abril deste ano, depois que o partido teve conhecimento da reportagem que o jornal estava preparando.
São exemplos de uso de dinheiro público para fins duvidosos que no mínimo deixam dúvidas sobre a utilidade dessa verba para a cidade e seus moradores. Ela tem outros pontos negativos. Com o aumento de seu valor em abril ? que elevou para R$ 9,8 milhões o gasto anual da Câmara ?, um vereador paulistano recebe, de verbas de gabinete, até R$ 18 mil por mês mais do que um deputado federal. Além da verba especial, o vereador dispõe de outra, que lhe permite contratar até 18 assessores.
Se esses gastos resultassem na melhoria da qualidade do trabalho da Câmara e no aumento de sua produtividade, a cidade se beneficiaria disso e seus contribuintes até aceitariam os custos adicionais. Mas a Câmara cumpre de maneira insatisfatória seu papel de fiscalizar o Executivo, e os vereadores dedicam a maior parte de seu tempo a atividades irrelevantes.
E, para a maior parte dos itens com os quais os vereadores gastam sua verba de gabinete ? advogados, gráficas, assessoria de imprensa e outros ?, a Câmara já dispõe de serviços próprios, pois seu quadro de pessoal é formado por 1.989 funcionários.
Para que a verba?
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