Imagem ex-librisOpinião do Estadão

A volta do lobby dos bingos

Exclusivo para assinantes
Por Redação
3 min de leitura

Tão logo sentiu que se tinha arrefecido o impacto do escândalo do mensalão, ao qual foi associado, e das operações da Polícia Federal contra os bingos, o poderoso lobby da jogatina voltou à cena com toda força no Congresso para tentar mais uma vez legalizar esse tipo de jogo, aproveitando-se da divisão da maioria dos partidos a respeito da questão. A importante vitória que ele acaba de conseguir, com a aprovação de projeto nesse sentido na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara, soa como um sinal de alarma. Habilidade, persistência e ousadia é o que não falta a esse grupo. Ao perceber que a maior resistência a ele, na área do governo, estava no Ministério da Fazenda, o relator do projeto, deputado João Dado (PDT-SP), e seu colega Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), presidente da Força Sindical, procuraram em fevereiro o secretário executivo da Pasta, Nelson Machado, para discutir a questão. Em consequência dessa e de uma nova conversa, dias atrás, Dado fez algumas "concessões" para tornar a proposta mais palatável: retirou do texto a legalização dos cassinos, deixou a fiscalização dos bingos a cargo do Ministério da Fazenda e da Receita Federal e aumentou o porcentual de royalties a ser pago ao poder público, que passou de 15% para 17% da receita, descontados prêmios e tributos. Para dar um tom "social" aos bingos, daquele porcentual 15% irão para a saúde, 1% para o esporte e 1% para a cultura. A União receberá 30% e os Estados, 70%. Na ânsia de seduzir os incautos ou de dar boas desculpas aos que querem aderir à jogatina, mas ainda sentem uma ponta de vergonha, Dado e seus companheiros vão a ponto de propor um cômico Catálogo Nacional de Pessoas Dependentes, que serão proibidas de frequentar os bingos, como se fosse possível dissociar jogo e vício. Não é por acaso que esse projeto nasceu com a marca de deslavada malandragem. Sua versão original é um projeto do deputado Antônio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP) que propõe exatamente o contrário - a proibição do jogo. Indicado para relatar a proposta, João Dado apresentou substitutivo virando-a do avesso, sem o menor constrangimento. Compreende-se a indignada reação de Mendes Thame: "É uma grande farsa. Se não querem meu projeto, derrubem e apresentem outro." O grande problema dos bingos, seu pecado original, é que eles não são o que parecem. Segundo cálculos da Associação Brasileira dos Bingos (Abrabin), o funcionamento legal das casas de bingo proporcionará cerca de R$ 6 bilhões anuais em impostos, R$ 12 bilhões em prêmios e R$ 6 bilhões de receita aos empresários que vão explorá-las. Atrás dessa fachada é que mora o perigo. Os bingos estão sabidamente longe de ser um passatempo inofensivo, principalmente para idosos e aposentados, como sugerem seus defensores. Há muito vêm sendo acumuladas provas da sua utilização para lavagem de dinheiro do crime organizado. Em 2004, por exemplo, o promotor de Justiça Rodrigo Dias Canelas chamou a atenção para documentos da Divisão Investigativa Antimáfia, da polícia italiana, encaminhados por ela ao Ministério Público de São Paulo, segundo os quais dinheiro sujo de várias origens, inclusive do narcotráfico, era lavado no Brasil por empresas ligadas à importação e exploração de jogos eletrônicos, com os quais grande parte dos bingos se envolveu. Seria ingênuo acreditar que os bingos - que, legalizados, serão explorados basicamente pelas mesmas pessoas - se curaram, por milagre, dessa doença. Na mesma ocasião, quando o Congresso discutia outro projeto legalizando os bingos, o então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, afirmou que tudo indicava que as atividades ligadas aos bingos serviam de fachada para a lavagem de dinheiro sujo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi mais contundente, quando comparou essa jogatina à prostituição infantil. Em vez de participar de entendimentos com os defensores da jogatina, o Ministério da Fazenda deveria alinhar-se com o pensamento do presidente a respeito dela. De Lula espera-se que, coerente ao que disse cinco anos atrás, ordene à base aliada no Congresso que vote contra o projeto de legalização dos bingos. E do maior partido da oposição, o PSDB, que fique ao lado do tucano Mendes Thame.