
30 de novembro de 2013 | 02h08
A presidente Dilma Rousseff adiantou a "revisão" para 1,5% em entrevista ao jornal espanhol El País. Revisões são normais, disse ela, e ocorrem também nas contas dos Estados Unidos. É verdade, mas parece ter havido uma confusão. Segundo a informação original, posta em circulação alguns dias antes dessa entrevista, a nova taxa de crescimento deverá resultar de uma alteração no cálculo, com a introdução de uma nova estimativa do setor de serviços. Não seria propriamente a correção de um erro estatístico, mas um aperfeiçoamento do sistema de dados. Mas isso deverá envolver uma reconstrução da série e é cedo para dizer, sem mais informações, como ficará o conjunto.
Os dados mais importantes, por enquanto, são outros: um crescimento de 1,5% em 2012 continuará sendo menos que pífio, inferior ao de grandes países em crise, como Estados Unidos (2,8%) e Japão (2%), e muito menor que a média dos emergentes e em desenvolvimento (4,9%). Atribuir esse desempenho à crise internacional é apenas uma forma de jogar sobre os outros a responsabilidade pelas próprias falhas, um discurso pouco melhor que o do mau-olhado e do sapo.
Do lado da indústria, principal fonte de empregos decentes e, no passado, foco mais importante de modernização tecnológica, as perspectivas continuam ruins. O desempenho da economia vem "de frustração em frustração", disse na quinta-feira o diretor de pesquisas e estudos econômicos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Francini. Em outubro, o indicador de nível de atividade (INA) da indústria paulista foi 0,4% menor que em setembro, descontadas os fatores sazonais, e 0,2% inferior ao de um ano antes. Além disso, o aumento do INA de agosto para setembro foi revisto de 1,3% para 0,2%. O avanço acumulado em 12 meses ficou em 2,2%. Mesmo a expansão de 2,5% estimada para o ano ficará longe de compensar - meramente zerar - a queda de 4,1% em 2012.
Do lado da oferta, o PIB brasileiro continuará puxado pela agropecuária e pelo setor de serviços. Do lado da demanda, o governo tem apostado na expansão do investimento. Se isso for confirmado, será um mero efeito estatístico, já que o total investido diminuiu no ano passado. Na melhor hipótese, o investimento medido pela formação bruta de capital fixo (recursos aplicados em máquinas, equipamentos, infraestrutura e outras instalações) ficará de novo na vizinhança de 19% do PIB. De fato, os componentes mais dinâmicos da demanda continuarão sendo o consumo privado, apesar de algum arrefecimento, e os gastos de governo, basicamente de custeio.
Não se sustenta uma grande economia em desenvolvimento com uma indústria estagnada e um volume ridículo de investimentos. Do lado privado, a disposição para investir depende principalmente da confiança na política e da expectativa de crescimento. As empresas já investiram com muito mais dinamismo em épocas de juros básicos mais altos, até porque as taxas cobradas pelo principal financiador, o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), sempre foram subsidiadas. Os subsídios continuam, mas a política do BNDES perdeu o rumo e também isso tem travado o crescimento.
Leilões bem-sucedidos no setor de infraestrutura poderão resultar em mais investimentos. Mas o êxito desses leilões tem sido turbinado pela promessa de subsídios por intermédio do BNDES ou da participação de estatais, como indicou o professor Sérgio Lazzarini, do Insper, em excelente artigo no Estado de quinta-feira. O governo poderia usar de outra forma esses bilhões. Por que atrair capital privado com subsídios, se os negócios são lucrativos? Essa foi a grande pergunta deixada pelo artigo.
Esse exemplo de mau planejamento e mau uso de recursos combina com o resultado das contas públicas. O superávit primário do governo central em outubro, R$ 5,4 bilhões, foi o mais baixo para o mês desde 2004. O acumulado em dez meses, R$ 33,4 bilhões, chegou a apenas 45,7% da a meta de R$ 73 bilhões, já inferior à inicial. Segundo o secretário do Tesouro, o governo central conseguirá nos dois meses finais os R$ 39,6 bilhões necessários para fechar a conta. Se conseguir, será graças a receitas extraordinárias, como as prestações do Refis, o programa de refinanciamento de impostos.
O setor público total só acumulou R$ 51,2 bilhões de superávit primário no ano, 46,1% do prometido para 2013. Em outubro, a contribuição de Estados, municípios e estatais foi de apenas R$ 932 milhões. Mas isso deixou de ser problema para o governo central, agora oficialmente comprometido só com o próprio resultado. Nem esse está garantido. Falta um capítulo sobre mau-olhado nos manuais de finanças públicas.
JORNALISTA
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