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Ameaça à Previdência

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Por Redação
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O rombo da Previdência vai crescer, inevitavelmente, se o governo for incapaz de conter a irresponsabilidade de sua base parlamentar. Estão em curso, no momento, dois ataques às contas previdenciárias. Num deles, congressistas se mobilizam para garantir aos aposentados, com qualquer nível de remuneração, o aumento do salário mínimo aprovado em 2006. Para isso, terão de rejeitar o veto presidencial a um projeto de lei do senador Paulo Paim, apresentado naquele ano. Se o reajuste for pago a quem recebe aposentadoria superior ao salário mínimo, a Previdência terá de pagar uma conta retroativa de R$ 36 bilhões. O outro ataque é contra o fator previdenciário, instituído em 1999 como novo componente do cálculo das aposentadorias. Se essa manobra for bem-sucedida, a reforma do sistema de pensões e aposentadorias será anulada ou desfigurada e haverá um grave retrocesso na gestão das contas públicas. No entanto, a reforma realizada há dez anos é insuficiente para garantir a longo prazo o equilíbrio das contas previdenciárias. É preciso, segundo eles, avançar na adaptação do sistema às novas condições do País, ajustando a aposentadoria a uma composição demográfica e a uma expectativa de vida mais próximas daquelas observadas nas sociedades mais desenvolvidas. Ao vetar a extensão do reajuste do salário mínimo a todas as categorias de aposentados, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já se opôs, e corretamente, a uma ação de parlamentares aliados. A iniciativa desses parlamentares foi apoiada, naturalmente, por oposicionistas interessados em criar dificuldades políticas para o governo. Esses oposicionistas poderão, agora, participar do movimento para derrubar o veto presidencial. Os articuladores políticos e líderes governistas no Parlamento serão novamente postos à prova. Com frequência, têm sido reprovados em testes desse tipo. Em relação a essa ameaça, o governo tem pelo menos uma posição clara: é preciso preservar o veto presidencial. No caso do outro ataque às contas previdenciárias, o quadro é mais confuso. O governo não pode ter interesse na eliminação do fator previdenciário, se isso implicar um enfraquecimento das finanças públicas. Mas o Executivo mostra-se disposto a aceitar pelo menos meia derrota. Não conseguiu impedir no Senado a aprovação do projeto de lei do petista Paulo Paim. Em vez de se empenhar para derrubá-lo na Câmara, decidiu tentar uma negociação para tornar a mudança menos custosa para as contas públicas. Para isso, autoridades do Executivo negociaram com o relator do projeto, deputado Pepe Vargas (PT-RS), uma fórmula de cálculo das aposentadorias. Essa fórmula descarta o fator previdenciário, mas não reabilita o critério em vigor até 1999. Pelo critério combinado, os candidatos à aposentadoria por tempo de serviço deverão somar sua idade e os anos de contribuição. Se o resultado for 95, o homem poderá aposentar-se com o valor correspondente à média da contribuição dos últimos 36 meses. A mulher terá esse direito se a soma for 85. Pela regra em vigor, uma mulher perde 25% do valor de sua aposentadoria, se se aposentar com 55 anos de idade e 31 de contribuição. Se um homem se aposentar com 51 anos de idade e 35 de contribuição, a perda será de 37,1% em relação ao valor da aposentadoria integral. Pelo critério negociado com o relator Pepe Vargas, as despesas serão maiores, portanto, do que se fosse mantido o fator previdenciário. O retrocesso poderá ser menor do que se houvesse o mero retorno à situação anterior à reforma de 1999, mas um recuo, de toda forma, ocorrerá. Além do mais, a nova mudança no cálculo será provavelmente reivindicada, na Justiça, pelas pessoas aposentadas com base na fórmula do fator previdenciário. Também isso resultará em maiores gastos para a Previdência. O conjunto das contas governamentais será afetado e parte do esforço para equilibrá-las e para reduzir o peso da dívida pública será perdida. Esse desajuste será sempre um obstáculo à redução dos juros e, portanto, à eficiência da economia nacional e ao poder de competição internacional das empresas brasileiras. Tudo isso resulta em menor criação de empregos e em menor prosperidade para a maior parte das famílias. Mas o prejuízo é inevitável quando o próprio governo se dispõe, sem maior resistência, a negociar uma solução ruim para suas contas.