26 de junho de 2015 | 03h00
A conjugação de duas iniciativas cujos primeiros movimentos já se tornaram visíveis anuncia o quadro sombrio que se desenha para o Planalto. De um lado, forças de esquerda reunidas numa aliança de pequenos partidos ideológicos com a ala autoproclamada “progressista” do PT articulam a formação de uma “frente ampla” de combate ao ajuste fiscal e à política econômica “liberal” personificada na figura do ministro Joaquim Levy. De outro lado, dentro do PMDB ganha corpo a disposição de devolver a Dilma Rousseff a coordenação política por ela delegada, em desespero de causa, ao vice-presidente da República, Michel Temer, o que implicaria, pelo menos tacitamente, o rompimento da combalida aliança dos peemedebistas com o governo petista.
De acordo com o jornal Valor, a oportunidade – na verdade, o pretexto – para que Michel Temer devolva a articulação política ao Planalto seria o fim da votação do ajuste fiscal no Congresso, que deverá ocorrer provavelmente em agosto. Com isso, estaria cumprida a missão confiada por Dilma ao vice-presidente da República. A essa intenção dos caciques peemedebistas – estimulada tanto pelo fato de Lula estar procurando se descolar de Dilma quanto pela crescente deterioração da credibilidade e da popularidade da presidente – não estaria alheio Michel Temer, um político geralmente cauteloso, cuja preocupação maior seria a de calibrar o avanço na direção do descolamento de Dilma para não comprometer gravemente o projeto de ajuste fiscal do qual o PMDB se tornou avalista. De resto, muitos peemedebistas – que consideram pacífica a opção de lançar candidato próprio no pleito presidencial de 2018 – entendem que o PMDB deve se apresentar já para as eleições municipais do próximo ano livre da conotação eleitoralmente negativa de uma aliança com Dilma e o PT.
De qualquer forma, a articulação da tal “frente ampla” contra a política econômica “liberal” avança a cada dia, tendo à frente, entre outros líderes das correntes de esquerda do PT, o fundador do partido, ex-ministro de Lula e ex-governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, que seria um dos responsáveis pela redação do manifesto do grupo, a ser divulgado no início de julho. Especula-se que por detrás desse movimento estaria o próprio Lula, embora essa possibilidade seja desmentida pelos articuladores. Afinal, não é despropositado imaginar que o ex-presidente se anime com a possibilidade de contar com o apoio de algo parecido com uma aliança de forças “progressistas” para embalar sua candidatura à Presidência em 2018 empunhando a bandeira do combate ao “liberalismo”. Isso se até lá Dilma e sua incompetência política e administrativa já não tiverem desmoralizado definitivamente o “progressismo” esquerdista aos olhos de um eleitorado que, na verdade, almeja condições dignas de vida representadas pela garantia de acesso a bens sociais e de consumo num ambiente de plena liberdade.
Esses dois movimentos – o do PMDB e o dos “progressistas” –, produtos de uma mesma circunstância, mas sem nenhuma relação um com o outro, significariam o cerco do Palácio do Planalto pela direita e pela esquerda, deixando pouco espaço para a ineficiente oposição partidária, representada pelo PSDB.
O risco desse tipo de jogo partidário é o de seus principais personagens se entredevorarem, deixando sozinho na cena algum ousado aventureiro.
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