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As aposentadorias especiais

Seja qual for o caminho a ser escolhido para alterar as regras previdenciárias dos Estados e municípios, é incontestável a necessidade de reforma

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Por Redação
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Em consonância com a realidade federativa, o governo federal decidiu, em meados do mês passado, retirar da reforma da Previdência os servidores públicos estaduais e municipais. Além de respeitar a autonomia de cada esfera da Federação, a medida contribuiria para a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287/2016 no Congresso. Segundo o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, a exclusão das previdências municipais e estaduais “facilita muito” a aprovação da PEC. “Tira 70% da pressão que estava sendo recebida” pelos parlamentares, disse Maia, logo após o governo federal anunciar a estratégica mudança.

Dias depois, o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy, anunciou a possibilidade de uma solução intermediária, que, sem impor uma solução única, despertasse a responsabilidade das unidades federativas.

De acordo com a ideia apresentada, Estados e municípios terão seis meses de prazo para promover mudanças nos regimes de aposentadoria de seu funcionalismo. Caso não alterem nesse prazo as regras para concessão dos benefícios, estarão sujeitos à reforma da Previdência geral. “Trata-se de uma ideia vinda da própria Câmara, para oferecer mais responsabilidade fiscal e para que os próprios governadores possam ter condições de argumentação junto às Assembleias Legislativas de seus respectivos Estados”, afirmou Imbassahy.

Seja qual for o caminho a ser escolhido para alterar as regras previdenciárias dos Estados e municípios, é incontestável a necessidade de reforma. O déficit do setor é crescente e sufocante. Em 2016, o rombo previdenciário dos servidores dos Estados e Distrito Federal foi de R$ 89,6 bilhões. Segundo a estimativa de Leonardo Rolim, consultor da Câmara dos Deputados, caso as regras atuais sejam mantidas, o déficit com as previdências estaduais deverá ser, até 2020, de pelo menos R$ 120 bilhões.

Além do rombo, o tratamento dado ao funcionalismo estadual institucionaliza privilégios. De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), as aposentadorias especiais são maioria nos Estados. A anomalia está difundida. No Rio de Janeiro, 57,7% dos servidores têm direito a elas. Em Minas Gerais, são 59,7%. Em São Paulo, 60,4%. O Estado recordista é o Rio Grande do Sul, com 61,2% de seus funcionários públicos tendo direito a um regime previdenciário mais brando do que a regra geral. Naturalmente, esses altos porcentuais de condições especiais provocam distorções. Os quatro Estados citados têm os maiores rombos previdenciários do País.

Em algumas categorias, os números são especialmente alarmantes. Em média, 96% dos policiais militares aposentam-se antes dos 50 anos de idade. Entre os policiais civis, o porcentual é de 75%. No caso dos professores, 64% deixam a sala de aula antes de chegar aos 50 anos. “Boa parte desses profissionais vai passar uma grande parcela da vida produtiva aposentada, bancada pelo Estado, quando poderia estar na ativa”, diz o autor do estudo, Claudio Hamilton Matos dos Santos.

A distorção é consequência das atuais regras previdenciárias. Por exemplo, as docentes do ensino infantil, médio e fundamental podem se aposentar com 25 anos de contribuição e 50 anos de idade. No caso dos homens, exigem-se 30 anos de contribuição e 55 anos de idade. Não há dúvida de que policiais e professores, por exemplo, merecem bons salários e boas condições de trabalho. É, porém, um tremendo equívoco pensar que se valoriza a categoria mandando seus profissionais de volta para casa em plena idade produtiva. Ao contrário, é um menosprezo a sua capacidade de trabalho, o que apenas reforça um círculo vicioso que vem estigmatizando essas profissões: por que investir na formação de profissionais que terão tão poucos anos de trabalho?

Federação significa autonomia e, consequentemente, responsabilidade. Assumir a reforma da Previdência é, portanto, consequência direta do respeito que União, Estados e municípios devem demonstrar pelos contribuintes-cidadãos.