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As notas do Enem

Das 100 escolas com as médias mais altas, 97 são privadas, têm alunos de nível socioeconômico alto e funcionam com turmas pequenas

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Por Redação
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Divulgadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, do Ministério da Educação (MEC), as notas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2015 revelaram que, das 100 escolas com as médias mais altas, 97 são privadas, têm alunos de nível socioeconômico alto e funcionam com turmas pequenas.

Das três escolas da rede pública, todas são colégios de aplicação vinculados a uma universidade federal. Por erro técnico, que já está sendo corrigido, o MEC não incluiu na listagem os institutos técnicos federais. Mesmo assim, a exemplo dos colégios de aplicação, os institutos técnicos têm regime pedagógico e orçamento diferenciados. No grupo das mil melhores do Enem de 2015, apenas 49 são escolas públicas – no ranking de 2014, eram 93, o que dá a medida da tragédia em que se converteu a rede pública de ensino médio. Em outras palavras, as escolas públicas com as maiores médias são exceções no âmbito de um sistema de ensino absolutamente incapaz de assegurar uma formação de qualidade a alunos pobres, cujas famílias enfrentam dificuldades no acesso a serviços essenciais.

Com base nas notas de 1.212.908 estudantes de 14.998 escolas do País, o Enem de 2015 revela, assim, que o sistema educacional brasileiro está longe de cumprir uma de suas principais atribuições, que é a de alfabetizar e formar adolescentes e jovens pobres – condição indispensável para que o País possa reduzir a pobreza. O abismo entre alunos ricos e pobres em matéria de desempenho escolar mostra o aprofundamento da desigualdade social e econômica e, por tabela, a incapacidade da rede pública de formar o capital humano de que o Brasil necessita para voltar a crescer.

O mais grave é que, nesse momento em que o Brasil precisa adotar novas tecnologias e modernizar a economia, o desempenho médio tanto das escolas públicas quanto das escolas privadas piorou em três áreas fundamentais. A nota de Matemática recuou de 481 para 475 pontos, entre 2014 e 2015. Em Linguagens, caiu de 511 para 504 pontos. Em Ciências da Natureza, a queda foi de 487 para 478 pontos. As notas aumentaram apenas em Ciências Humanas e Redação. Essas provas avaliam competências essenciais, como raciocínio matemático, capacidade de relacionar conhecimentos de diversas áreas, habilidade para resolver problemas, leitura e interpretação de textos.

Ao avaliar os números do Enem, dispensando especial atenção para o reduzido número de escolas públicas na lista das mil melhores e apontando a necessidade de reformas urgentes no ensino médio, vários pedagogos lembraram que a situação social dos alunos é um dos fatores que mais pesam na nota. Assim, adolescentes e jovens pobres, além de contarem com pais e mães pouco escolarizados, têm limitado acesso a bens culturais – o que, como um círculo vicioso, reforça sua condição socioeconômica.

Outros pedagogos chamam a atenção para um fator ainda mais importante, lembrando a maneira errática e inepta com que a educação foi tratada nos 13 anos de lulopetismo, ora valorizando a expansão do ensino superior, ora anunciando mudanças de programas concebidos às pressas e com objetivos eleiçoeiros. Os governos do PT deixaram-se levar pela ilusão de que a crise do ensino básico – no qual está incluído o ensino médio – poderia ser superada com aumento dos recursos propiciados pelos royalties do petróleo.

As notas do Enem mostram que essa ilusão resultou em enorme desperdício de dinheiro com programas irrealistas e que faltou gestão competente e um conjunto integrado de ações que envolvessem planejamento, definição de padrões de qualidade, metas realistas e melhor avaliação de resultados. Se a proposta de reforma do ensino médio imposta recentemente por medida provisória pelo presidente Michel Temer vai mudar esse cenário, isso só poderemos saber depois que ela for implementada, o que não deve acontecer antes de 2019. Até lá, as próximas edições do Enem estarão retratando os desastres de 13 anos de lulopetismo no ensino básico.