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As prioridades do CNMP

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Por Redação
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Desde que a Constituição de 88 ampliou suas prerrogativas, o Ministério Público (MP) vem enfrentando problemas para exercer, com eficácia e rapidez, todas as atribuições que lhe foram atribuídas. Sem promotores de Justiça, procuradores e serventuários administrativos em número suficiente para dar conta do volume de trabalho, com recursos orçamentários aquém de suas necessidades e com dificuldades para se adaptar à Lei de Responsabilidade Fiscal, tanto a Procuradoria-Geral da República quanto as Procuradorias-Gerais de Justiça apresentam desempenho insatisfatório. Para tentar resolver o impasse, o plenário do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) ? órgão encarregado de exercer o controle externo da instituição ? decidiu, por unanimidade, recomendar a todas as promotorias e procuradorias do País que redefinam sua atuação institucional, dando prioridade aos processos e questões com maior "impacto social". A discussão começou quando promotores e procuradores começaram a temer a aplicação de sanções disciplinares por eventuais falhas decorrentes de sobrecarga de trabalho. A corporação alega que o antigo Código de Processo Civil (CPC), editado em 1973, a obriga a intervir nas ações e nos procedimentos civis, muitos deles envolvendo questões sem "relevância social", enquanto a Constituição de 88 privilegia a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais. O debate ficou mais acirrado depois que o Ministério Público do Estado da Bahia baixou resolução exigindo que promotores e procuradores atuem em todos os mandados de segurança. Aprovada na última sessão de abril, a recomendação do CNMP considerou que a resolução do MP baiano não tem caráter obrigatório e que os promotores e procuradores estaduais poderiam circunscrever sua atuação somente aos mandados de segurança em que há "interesse público primário" em jogo. E, no que se refere à incompatibilidade entre prioridades do CPC e prioridades da Carta Magna, o CNMP estimulou as Procuradorias-Gerais de Justiça a autorizarem seus profissionais a concentrar sua atuação basicamente nos casos com "maior repercussão social". A decisão do CNMP foi fundamentada num extenso e cuidadoso parecer apresentado pelo conselheiro Cláudio Barros Silva. Em seu voto, com 78 páginas, ele disse que as restrições orçamentárias estão impedindo os MPs estaduais de crescer, para atender aos interesses dos cidadãos e da sociedade. "Embora absolutamente necessária, a Lei de Responsabilidade Fiscal tem submetido instituições à estagnação nos últimos cinco anos. Em praticamente todos os Estados, o MP está no limite de alerta ou no limite prudencial. Impõe-se, por consequência, que tenhamos a noção clara e exata do limitado tamanho da instituição e o que deve ser feito pelos seus membros, a fim de que o MP possa ser essencial, não pela quantidade de suas intervenções, mas, sim, pela qualidade da sua presença", afirmou. Se, invocando restrições orçamentárias, cada órgão público decidisse escolher o que vai fazer, entre seu rol de atribuições, os serviços essenciais seriam levados ao colapso. Por maiores que sejam as restrições orçamentárias das Procuradorias-Gerais de Justiça e da Procuradoria-Geral da República, nada justifica o desprezo a ações e procedimentos cíveis sem "maior repercussão social". Essas ações envolvem interesses de cidadãos que, confiando na Constituição e no Estado de Direito, bateram na porta dos tribunais para lutar por seus interesses. Em outras palavras, se a legislação obriga os promotores e procuradores a intervir nessas ações, a eventual omissão desses profissionais equivale à negação de direitos.Em seu voto, o conselheiro Cláudio Barros Silva afirmou que o MP deveria valorizar os casos relacionados à probidade administrativa, proteção do patrimônio público, qualidade dos serviços públicos, infância e juventude, consumidores e meio ambiente ? sem dúvida, matérias de interesse público. Contudo, é inadmissível que, invocando carência de recursos, o MP relegue para segundo plano as outras matérias de sua competência.