21 de junho de 2010 | 00h00
Isso seria motivo de apreensão. Mas o Brasil já superou a fase em que alguns setores identificavam nas "transferências internacionais" as raízes de nossos males econômicos. Elas são livres e devem continuar livres, desde que não resultem de atividades ilícitas e cumpram as obrigações tributárias, estando em conformidade com as leis em vigor.
Mas o País está sofrendo, sim, o impacto da crise fiscal que se abate sobre os países da zona do euro e que, pelo menos até agora, não se refletiu nas exportações para nenhum país europeu. A situação é mais séria na Espanha e em Portugal, que figuram hoje como grandes investidores no Brasil. É significativo que as transferências de lucros para a Espanha tenham atingido cerca de US$ 1,1 bilhão no quadrimestre, um aumento de 80% com relação ao mesmo período do ano passado. Já os investimentos espanhóis no Brasil tiveram um recuo de 74% de janeiro a abril.
É normal esperar que, com a aceleração do ritmo de atividade no Brasil, as empresas instaladas no País obtenham maiores ganhos e que as subsidiárias das múltis remetam mais lucros para o exterior, o que tem sido também favorecido pela sobrevalorização do real. E essa tendência se acentua quando os países que aqui mais investem passam por crises.
Como mostrou reportagem do Estado (15/6), as remessas de lucros cresceram mais de dez vezes desde 2000, atingindo o pico de US$ 33,8 bilhões em 2008, sob influência direta das turbulências da economia nos EUA, que desembocaram na crise de 2008/2009, com repercussões globais.
Isso, naturalmente, causa problemas para o balanço de pagamentos do Brasil. Com um superávit comercial bem mais baixo que nos últimos anos e com forte pressão sobre a conta de serviços e rendas, que se agrava com o maior peso do déficit do item remessa de lucros e dividendos, o déficit em transações correntes pode superar US$ 76,1 bilhões este ano, como estima o Banco Central. Tudo vai depender do saldo da conta de comércio, que está em recuperação.
O Brasil não tem motivo para adotar restrições, ainda que burocráticas, ao fluxo internacional de capitais, mesmo porque é um de seus grandes beneficiários. Os investimentos diretos das empresas europeias podem cair, as suas remessas podem aumentar, mas não é irrealista esperar que o investimento estrangeiro cresça no segundo semestre deste ano, podendo alcançar US$ 36 bilhões em dezembro, como é a expectativa do mercado. Como mostrou um estudo do professor Antonio Corrêa de Lacerda, da PUC, o Brasil é, entre os Brics, o país que mais recebeu investimentos diretos estrangeiros em relação ao PIB.
Deve-se ter em conta também que hoje são dezenas as empresas brasileiras com braços no exterior. Se hoje os lucros remetidos para o País por essas companhias são relativamente pequenos, eles tendem a crescer, reduzindo o déficit no item de remessas de lucros e dividendos.
As reservas internacionais, que já alcançam US$ 251,64 bilhões (posição em 14/6), constituem uma poderosa defesa contra crises internacionais de liquidez. Mas isso não basta. O Brasil estará tanto mais protegido se moderar o crescimento da economia e conseguir manter as contas do setor público em ordem. E não é isso que o governo está fazendo.
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