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Assim fica mais fácil

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Por Redação
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Repetindo o que fizera no início do ano passado, na primeira reunião do Ministério de 2012 o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que também neste ano o governo cumprirá a meta fiscal - e, em 2012, deverá ser alcançada a meta "cheia", isto é, sem abater das despesas os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O governo fará isso, assegurou o ministro, preservando ao máximo os investimentos e cortando as despesas de custeio.A tarefa do governo será facilitada por uma espécie de artifício orçamentário, que lhe permite gastar sem ameaçar as metas fiscais, por meio da transferência da quitação das despesas para o exercício seguinte. Essa prática tem sido cada vez mais utilizada pelos governos do PT. Em 2012, as despesas não quitadas em 2011 e em exercícios anteriores e jogadas para a frente, conhecidas como "restos a pagar", atingiram um valor recorde. Essas despesas constituem uma espécie de orçamento paralelo, o que torna ainda mais difícil o acompanhamento da execução do Orçamento anual em vigor.Instrumento destinado a permitir a conclusão de uma obra em andamento, para a qual já foram empenhados os recursos necessários, mas ainda não quitada, os restos a pagar no governo federal passaram a crescer de maneira exorbitante a partir de 2006. Naquele ano, totalizavam R$ 21,7 bilhões. Em 2011 alcançaram R$ 128,7 bilhões.No início do ano passado, numa tentativa de demonstrar esforço para dar um pouco mais de racionalidade à administração orçamentária, o governo Dilma chegou a anunciar que cancelaria cerca de R$ 34 bilhões de restos a pagar, sobretudo os que vinham de exercícios anteriores a 2010. O anúncio provocou forte reação na base aliada e o crescimento dos restos a pagar indica que, em boa medida, o protesto funcionou.O total de despesas não pagas no primeiro ano do governo Dilma e transferidas para 2012 é de mais de R$ 152 bilhões, de acordo com cálculo da organização não governamental Contas Abertas. Esse valor é 18% maior do que os restos a pagar deixados pelo governo Lula para serem quitados por sua sucessora.Uma parte dos restos a pagar em 2012 se refere a despesas autorizadas, empenhadas e liquidadas, ou seja, a obras já concluídas ou a serviços efetivamente prestados e bens adquiridos e entregues ao governo, restando apenas sua quitação final, isto é, o desembolso do dinheiro. Mas essas despesas somam apenas R$ 24 bilhões, menos de 20% do total de pagamentos transferidos. A grande fatia dos restos a pagar se refere a gastos não processados. São despesas planejadas, autorizadas e empenhadas - ou seja, seu valor já foi reservado para pagamento futuro -, mas referentes a serviços ainda não prestados ou a obra não concluída.A existência de restos a pagar em volume tão grande impede a execução de obras novas e o início de muitos planos do governo. Nos últimos seis anos, como observou o economista Mansueto Almeida em entrevista ao jornal Valor (24/1), mais da metade dos investimentos realizados pelo governo federal se referia a recursos previstos em orçamentos de exercícios anteriores. Em 2011, quase 60% dos R$ 43,9 bilhões que o governo investiu eram restos a pagar.O primeiro ano do governo Dilma deixou para serem quitados em 2012 R$ 57,2 bilhões em investimentos em estradas, aeroportos e projetos do PAC. Isso corresponde a 71,2% dos R$ 80,3 bilhões de investimentos do governo federal previstos no Orçamento para 2012 sancionado há pouco pela presidente da República. "Caso opte por quitar os débitos, Dilma Rousseff terá apenas R$ 23,1 bilhões para aplicar em novos projetos de infraestrutura no País", observou o Contas Abertas em nota.Na prática, isso significa que os meses gastos por deputados e senadores na discussão do projeto da lei orçamentária e na definição das prioridades de investimentos em 2012 terão pouco efeito prático."Os valores atuais (dos restos a pagar) são uma aberração", disse a professora Margarida Gutierrez, da UFRJ, ao jornal Valor. "Fica complicado projetar qual será o superávit primário quando se tem um orçamento paralelo de valor tão significativo."