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Até quando?

A mais recente investigação sobre o Primeiro Comando da Capital (PCC) não mostra apenas que ele está bem vivo, mas em expansão

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Por Redação
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A mais recente investigação da Polícia Civil e do Ministério Público Estadual (MPE) sobre a estrutura e a rede de cumplicidades do Primeiro Comando da Capital (PCC) não mostra apenas que ele está bem vivo, o que já era sabido, apesar das reiteradas declarações das autoridades de segurança pública do Estado de que o cerco em torno dele está se fechando. O mais grave é que esse grupo criminoso está em franca expansão, com base numa organização de tipo empresarial, altamente sofisticada.

O trabalho dos policiais e promotores, encaminhado à Justiça, identificou 1.001 detentos que atuam como “gerentes” encarregados de tomar e transmitir as decisões do PCC e ordenar os pagamentos a serem feitos por ele em São Paulo. Eles formam uma espécie de conselho deliberativo, órgão máximo da organização criminosa, à frente da qual continua o chefão Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola. Constatou-se também que, sempre preocupado em se manter ágil e atualizado, o PCC estava passando por uma reestruturação e se preparava para adotar um novo modelo de organização a ser implantado em breve.

Essa investigação trata de outro ponto da maior importância: o sistema de comunicação, que é um dos pilares do PCC. Com base nela foi feita em novembro a Operação Ethos, que desnudou o esquema de cooptação de advogados venais – cuja existência já era conhecida, mas a respeito do qual faltavam indícios mais consistentes e provas –, encarregados de transmitir decisões e orientações do PCC para os bandidos que atuam sob suas ordens fora dos presídios. Foram então presos 33 desses profissionais suspeitos de integrar o esquema.

Eles ajudavam a organização criminosa valendo-se dos direitos legais da prestação de assistência jurídica aos presos, como o de visitá-los com frequência e ter com eles conversas reservadas. Como diz o relatório final dos investigadores, o trabalho daqueles profissionais “evoluiu da licitude para a ilicitude blindada pelo sigilo constitucional do advogado”. Não por acaso, estima-se que o PCC gaste anualmente nada menos que R$ 6 milhões com advogados, inclusive os que se deixam corromper.

A audácia do PCC nesses aliciamentos pode ser medida pelo fato de, na mesma ocasião, ter sido preso Luiz Carlos dos Santos, vice-presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos de São Paulo, que confessou receber pagamento mensal para cumprir tarefas determinadas pela organização criminosa. Comprovou-se ainda a existência de médicos e dentistas, em especial da região de Presidente Prudente, que fazem “trabalho” semelhante ao de advogados, como constataram os investigadores ao verificar que recebiam pagamentos incompatíveis com os serviços prestados. É o caso de um médico que recebeu R$ 81 mil sem justificativa plausível.

Tão ou ainda mais grave que tudo isso é o apoio, de fato, que o Estado dá ao PCC. Afinal, os bandidos desse grupo agem sob a sua proteção dentro das penitenciárias, a maior parte das quais controla, sob as barbas das autoridades. É notório que na penitenciária de Presidente Wenceslau, no interior do Estado, onde se encontram Marcola e outros líderes do bando, funciona o quartel-general do PCC. Além de advogados, médicos e dentistas que agem como seus mensageiros, o PCC se aproveita da incapacidade do Estado de impedir o uso generalizado de telefones celulares.

Não admira que o PCC continue a se expandir rapidamente – está presente em 22 dos 27 Estados, em muitos dos quais trava uma violenta luta contra organizações rivais, e também em países vizinhos, como o Paraguai – e se tenha transformado numa das maiores organizações criminosas do País. E que já domine boa parte do tráfico de drogas, a mais lucrativa das atividades criminosas. O espantoso é que essa história dura mais de duas décadas, durante as quais o PCC não parou de dar demonstrações de sua força e de seu atrevimento. Até quando isso vai durar? O que falta ainda para o poder público reagir?