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Barbosa, crítico do governo

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Por Redação
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Ninguém superou o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, nas críticas ao governo, ontem, durante sua audiência na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Suas críticas foram dirigidas, é claro, aos antecessores, ou, mais precisamente, ao ex-ministro Guido Mantega, ocupante do posto entre 27 de março de 2006 e 1.º de janeiro de 2015. Ao mencionar, por exemplo, a intenção de pagar compensações em atraso a Estados exportadores, acrescentou: “Desde que assumi o Ministério da Fazenda, tenho procurado resolver pendências que meus antecessores não resolveram. Isso não vai ficar para o Orçamento do próximo ano”.

Esse foi um dos comentários mais leves sobre os erros e desmandos acumulados antes de sua gestão. Ao defender a proposta de meta fiscal mais flexível, com espaço para um déficit de até R$ 96,65 bilhões, tratou de esclarecer: “O pedido agora está sendo feito no começo do ano para dar transparência e previsibilidade, e, principalmente, a solicitação vem em conjunto com reformas de longo prazo no âmbito estadual e no âmbito da União”. O advérbio “agora” estabelece uma clara distinção entre a iniciativa do atual ministro e as práticas anteriores.

Outras palavras indicaram a distinção entre os velhos e os novos costumes de forma bem mais explícita: “Antes solicitavam operações fiscais no fim do ano e não se adotavam medidas para que isso não se repetisse. Queremos criar o compromisso de que, se medidas fiscais forem utilizadas, vamos prestar contas de tudo que será feito”.

As desonerações fiscais, amplamente usadas na gestão anterior para beneficiar grupos e setores selecionados pelo Executivo, também foram criticadas, mas a condenação, nesse caso, foi em resposta a uma pergunta. Segundo Barbosa, essa política “foi longe demais”. Ele defendeu, no entanto, subsídios ao transporte público e à cesta básica de consumo.

Uma das condenações mais severas foi proferida contra o famigerado Refis, o programa de refinanciamento de dívidas fiscais. Segundo Barbosa, a ocorrência de “muitos Refis” foi um estímulo ao descumprimento das obrigações tributárias. A mesma avaliação foi formulada muitas vezes, desde muitos anos, em editoriais de jornais e em comentários de analistas do setor privado. Mas o governo insistiu, até há pouco tempo, em reeditar esse expediente, de forma previsível, para conseguir um dinheiro extra e reforçar a receita sempre insuficiente para compensar a expansão das despesas.

“Muitas empresas”, disse Barbosa, “ficam esperando que haja uma nova renegociação de dívidas. Temos de evoluir para que não se tenham mais Refis em sequência crônica. É preciso dar instrumentos de crédito adequados para que as empresas possam administrar suas obrigações sem ter de atrasar os impostos.”

Todos esses truques – atraso de pagamentos, improvisação de medidas no fim do ano, repetição de renegociações com devedores do Fisco, etc. – foram apoiados pelos governantes petistas. Foram mais amplamente usados no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, quando o governo brasileiro se tornou internacionalmente famoso pela contabilidade criativa.

O ministro Barbosa poderia ter ido mais longe e condenado a manutenção do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), criado em 2009 como resposta à crise e prorrogado, de forma injustificável, nos anos seguintes. Mas até os maiores surtos de sinceridade crítica podem ter limites.

O ministro defendeu as propostas de flexibilidade fiscal em 2016, de recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira e de implantação de metas plurianuais para as contas públicas. Durante a exposição ele tentou, de uma ou de outra forma, conseguir um voto de confiança. O reconhecimento das lambanças praticadas até recentemente foi uma forma de reforçar a mensagem. Não se sabe se a presidente ficou – para usar uma de suas palavras favoritas – estarrecida. Ela devia estar mais preocupada com o desembarque do PMDB.