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Bens públicos malcuidados

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Por Redação
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O descaso das autoridades com bens públicos estimula as invasões, como essa do prédio do INSS localizado na Rua Álvaro de Carvalho, ao lado da Avenida 9 de Julho, ocupado segunda-feira. O prédio já havia sido invadido duas vezes, no ano passado, pelo mesmo Movimento dos Sem-Teto - e nada assegura que isso não se repita.A União é dona de meio milhão de imóveis, dos quais 5% de uso próprio e os outros, em grande parte, dominiais, como os chamados imóveis de marinha, muitos deles vagos ou ocupados por terceiros. A Previdência Social recebeu em seus 87 anos milhares de imóveis em pagamento de dívidas, mas nunca divulgou um balanço completo das propriedades nem da possibilidade efetiva de vendê-las. A maioria desses imóveis já deveria estar regularizada e vendida ou, se houvesse viabilidade, transformada em habitação e transferida a preços subsidiados às populações de baixa renda.O fato de muitos imóveis nunca terem tido boa documentação nem registro em cartório e estarem ameaçados de invasão não justifica a ausência de esforços para a regularização. A rigor, alguns imóveis da União nem sequer existem. Num tempo em que as fraudes imobiliárias eram mais frequentes, áreas chegavam a ser comercializadas várias vezes - e algumas foram dadas em pagamento à Previdência.Em 2009, segundo o Balanço Geral da União, esta era titular de ativos reais no montante de R$ 2,8 trilhões, dos quais R$ 2,2 trilhões de natureza não financeira. Mas no Balanço não há maiores informações sobre os imóveis e seu valor nem menção aos que pertencem ao INSS. Não é estranho, portanto, que se sucedam as invasões de imóveis do INSS ou de outros órgãos públicos.As invasões seguem um modelo conhecido. Centenas de pessoas ocupam o prédio, enquanto os assessores de imprensa do grupo invasor chamam os jornais locais e internacionais e mobilizam internautas. O objetivo é ganhar espaço na mídia global. Como divulgou o Estado terça-feira, há um grupo de comunicação na Frente de Luta por Moradia (FLM) que alimenta o twitter, o flickr (álbum de fotos) e os blogs. "A gente usa computador ou celular", disse um dos coordenadores do movimento.Quando vão a Brasília, os invasores são bem recebidos pelas autoridades. Em 31 de agosto, como informa o site da Secretaria do Patrimônio da União (SPU) do Ministério do Planejamento, representantes de órgãos públicos - a SPU, a SPU/DF e o Ministério das Cidades - reuniram-se com seis membros do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST). O objetivo declarado era buscar soluções habitacionais para a região de Brazlândia, a 59 km de Brasília. Não pareceu incomodar as autoridades a falta de legitimidade do movimento.As invasões não deveriam ser toleradas pelo governo. Mas se este não cuida da segurança dos imóveis nem os vende, mostra tolerância com os invasores.Em fevereiro, o INSS anunciou a venda de cerca de 200 imóveis, de um conjunto de 3.400 terrenos, apartamentos, casas e prédios que deverão ser regularizados - apenas 513 têm boa documentação - e colocados à venda. Em agosto - e novamente nesta semana - foi prometida a venda de 670 imóveis em 23 Estados. Entre julho e setembro, a Previdência realizou 11 leilões e outros 4 estavam marcados para esta semana, um dos quais já foi cancelado. Muitas ofertas não alcançaram o valor mínimo. E não há prazo para a venda da maioria dos imóveis nem o INSS informa sobre o impacto favorável da venda para diminuir os déficits previdenciário e habitacional (este é calculado em não menos de 6 milhões de unidades). Em 2008, apenas 21 imóveis da União foram declarados de interesse para projetos habitacionais e incorporados ao fundo social de moradia FNHIS.Cabe aos entes públicos administrar e dar ampla divulgação das propriedades que estão em nome da União, Estados e municípios - e das ações que desenvolvem para melhor utilizá-las. Mas nada indica que os governos pretendam cumprir à risca suas responsabilidades.