22 de agosto de 2015 | 03h00
Um ano atrás ninguém poderia imaginar que Correa passaria pelos apuros que ora enfrenta. Desde 2007, quando chegou ao governo, o presidente equatoriano vem construindo uma estrutura de comando que abrange todos os Poderes e se sustenta em uma série de leis que lhe garantiram o controle, direto ou indireto, dos movimentos sociais e de outros grupos organizados da sociedade civil. Tudo isso com a garantia de que a imprensa independente estaria constrangida por um sistema implacável de censura e de asfixia econômica.
Essa mal disfarçada ditadura foi “legitimada” por um período de bonança proporcionada pela alta dos preços do petróleo. Os programas sociais decolaram, assim como a popularidade de Correa. Em vez de aproveitar o bom momento para fazer poupança e garantir recursos para investimentos quando a conjuntura não fosse tão favorável, o autocrata gastou em grandes obras e aumento da máquina estatal, além de ampliar a dívida nacional, em especial com a China.
A virada nos preços do petróleo atingiu em cheio a economia equatoriana, que já vinha apresentando sinais de anemia. A insatisfação social cresceu e hoje envolve quase todos os setores à esquerda e à direita. Mesmo os índios, supostos beneficiários das políticas sociais de Correa, se voltaram contra o presidente e marcham pelas principais cidades do país para exigir a saída do presidente.
Ainda que em menor escala, o presidente da Bolívia, Evo Morales, também enfrenta movimentos que questionam seu governo. Os mineiros da região de Potosí fizeram greve e manifestações no mês passado, denunciando que Morales abandonou a região – que sofre com a queda dos preços dos minérios. Apesar de toda a propaganda governista a respeito de justiça social, os moradores da rica Potosí continuam muito pobres e, portanto, com muitos motivos para criticar o autocrata bolivariano.
O fato é que, embora a economia boliviana tenha sido conduzida com prudência e mostrado sinais de crescimento nos últimos tempos, Morales não conseguiu ainda cumprir muitas das promessas que fez em cima dos palanques – e já começou a aumentar os gastos públicos, ameaçando o equilíbrio das contas. Com isso, as manobras autoritárias de Morales para mudar a lei e poder concorrer a um novo mandato são rechaçadas hoje por quase 60% dos bolivianos, segundo pesquisa recente.
Tanto Correa quanto Morales colhem os frutos da ilusão que criaram a respeito de um modelo econômico baseado apenas no poder do Estado – que, segundo sua propaganda, poderia criar uma nova era de prosperidade na América Latina. Diante da insatisfação de seus governados, a ambos só resta recorrer ao surrado discurso bolivariano de que são vítimas das “oligarquias golpistas” a serviço do “imperialismo americano”.
O receio de equatorianos e de bolivianos é que, com o propósito de se segurarem no poder, Correa e Morales recorram de vez ao modelo chavista venezuelano – repressão desenfreada à oposição, estatização total e destruição do sistema produtivo. A Venezuela, com sua inflação de mais de 200%, sua escassez de produtos básicos e sua total falta de liberdades, surge como o pesadelo latino-americano. Como disse ao El País o líder de uma das manifestações no Equador: “Protestamos contra esta quase ditadura que temos aqui, que quer se perpetuar no poder e nos converter em uma Venezuela. E isso nós não vamos permitir”.
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