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Caos no registro de patentes

Há mais de 230 mil pedidos na lista de espera do Inpi, que só recentemente passou a aceitar a documentação por meios eletrônicos

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Por Redação
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Diante da burocracia do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi), que demora em média cerca de 11 anos para registrar uma patente, muitas empresas brasileiras estão optando por registrá-las nos Estados Unidos, onde o processo leva apenas 3 anos. Há mais de 230 mil pedidos na lista de espera do Inpi, que só recentemente passou a aceitar a documentação por meios eletrônicos. Até janeiro de 2017, os pedidos de patente – que envolvem centenas de páginas – tinham de ser enviados em papel, pelo correio.

A insegurança jurídica criada para as universidades e empresas pelo excesso de burocracia do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, ao qual o Inpi está vinculado, é um dos lados do problema. O outro diz respeito à vida útil das tecnologias desenvolvidas ou utilizadas no País e que são decisivas para que a economia brasileira ganhe competitividade no comércio mundial, para voltar a crescer. A tramitação do processo de registro de uma patente é tão morosa que, em alguns casos – como na área de telecomunicações –, a inovação tecnológica já está obsoleta quando o processo é finalmente concluído. Dos mais de 230 mil pedidos que aguardam registro no Inpi, muitos foram protocolados há mais de dez anos e dificilmente sua aprovação terá ainda alguma serventia ou sentido econômico, uma vez que o tempo corroeu o benefício que a invenção ou descoberta tecnológica poderia proporcionar. Há dois anos, por exemplo, os órgãos responsáveis pela avaliação técnica de pedidos de patente examinaram um limpador de cabeçote de videocassete – equipamento em desuso desde 2000.

Além disso, a morosidade e a ineficiência do Inpi propiciaram o surgimento de despachantes, ou seja, de grupos que se oferecem para “ajudar” na intermediação do processo, lucrando com isso. É esse o caso, como mostrou a reportagem do Estado, da Associação Nacional dos Inventores (ANI), entidade que chega a cobrar R$ 40 mil de inventores, sem oferecer qualquer garantia por seus serviços. Os diretores da ANI alegam que o valor cobre os gastos com o serviço, que, de tão amador, inclui uma pesquisa no Google, para saber se alguém já teve a mesma ideia antes. Nas empresas e centros de pesquisa, expedientes como esse e o anacronismo das regras do Inpi sofrem críticas acirradas. “Isso atrasa e prejudica a inovação no Brasil”, diz Ado Jório, pró-reitor de pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Como a agilidade no registro de patentes é um requisito básico para o estímulo à inovação de processos e produtos, o governo – pressionado por universidades e empresas – prometeu há alguns meses investir na informatização dos serviços de análise dos pedidos de patentes protocolados na década de 2010, para reduzir o tempo médio de espera para cinco anos. O objetivo, contudo, não foi atingido, apesar de alguns técnicos terem sido contratados para integrar o quadro de pesquisadores encarregados de analisar os processos.

Para tentar acabar de uma vez por todas com a fila de espera, o Inpi tomou então a decisão de aprovar automaticamente – ou seja, sem o devido exame técnico e jurídico – todos os registros que aguardam patente, com exceção dos farmacêuticos. Segundo a direção do órgão, as empresas que se sentirem lesadas terão de procurar a Justiça ou impetrar pedido de nulidade em até 90 dias.

A iniciativa causou espanto nos meios jurídicos, na comunidade científica e na iniciativa privada. Isso porque, ao jogar a responsabilidade para os tribunais, que também são muito lentos, o Inpi consagrou sua inépcia e fez letra morta da Lei de Propriedade Intelectual, ampliando a insegurança jurídica no setor de patentes. “É absurdo. Se eu mandar um pedido de patente falando que beber água é minha invenção, ele será aprovado automaticamente e todos terão de pagar royalties para mim”, diz o pró-reitor de pesquisa da UFMG, não escondendo sua perplexidade com tanta demonstração de incompetência.